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sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

A IGREJA DENTRO DA LEI - Remessa de Valores ao Exterior

Por Adiel Teófilo.

Há igrejas evangélicas em nosso país que desenvolvem projetos missionários no exterior. Por isso frequentemente enviam a outros países recursos financeiros destinados ao sustento de Pastores e Missionários, bem como à manutenção de igrejas e obras assistenciais. Apesar de não encontrarem maiores dificuldades para enviar esses recursos, os representantes dessas igrejas não raras vezes têm dúvidas quanto à regularidade dessas remessas em face da imunidade tributária concedida às entidades religiosas. 

Surge assim o questionamento: as igrejas podem ou não destinar parte dos seus recursos financeiros a pessoas físicas ou a igrejas que mantém em funcionamento no exterior? Qual é a fundamentação legal que autoriza ou não proíbe essa prática? Para responder a essas indagações, precisamos analisar o tratamento jurídico que a legislação dispensa às igrejas, comparando com o tratamento dado a outras entidades que também são de direito privado, como veremos a seguir.

Da Imunidade Tributária dos Templos Religiosos

É de amplo conhecimento que as igrejas são beneficiadas com a imunidade tributária prevista no art. 150, da Constituição Federal de 1988. Além dos templos religiosos, outras entidades jurídicas também são alcançadas por essa imunidade, conforme consta do texto Constitucional que trata das limitações ao poder de tributar:

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
[...]
VI - instituir impostos sobre:
[...]
b) templos de qualquer culto;
c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei;
[....]
§ 4º As vedações expressas no inciso VI, alíneas "b" e "c", compreendem somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas. (grifamos)

Nota-se que o legislador Constituinte, além de garantir a desoneração tributária em favor das entidades religiosas (alínea “b”), assegurou também a imunidade em favor dos partidos políticos, entidades sindicais dos trabalhadores, instituições educacionais e assistenciais beneficentes (alínea “c”). Desse modo, conforme prescreve o § 4º, essas entidades não podem ser tributadas quanto ao patrimônio, a renda e à prestação dos seus serviços, desde que esse conjunto do patrimônio, renda e serviços, esteja relacionado com as finalidades essenciais de cada uma dessas entidades.

Até aqui parece não existir distinção entre as instituições acima mencionadas. No entanto, constata-se que ao final da alínea “c” acima transcrita, consta a seguinte expressão: “atendidos os requisitos da lei”. Significa dizer que os partidos políticos, entidades sindicais dos trabalhadores, instituições educacionais e assistenciais beneficentes, para usufruírem da imunidade tributária sobre o patrimônio, renda e serviços, devem atender aos requisitos estabelecidos em lei complementar.  

Nesse sentido, o Código Tributário Nacional (CTN), instituído pela Lei nº 5.172 de 25 de Outubro de 1966, estabelece normas complementares às limitações Constitucionais ao poder de tributar. Esse Diploma Legal, com eficácia de Lei Complementar foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988, por força do § 5º do art. 34 das Disposições Constitucionais Transitórias. Os artigos 9º e 14, ambos do CTN, preconizam algumas condições que devem ser cumpridas para que as entidades possam gozar da imunidade tributária, a saber:

Art. 9º É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
[...]
IV - cobrar imposto sobre:
[...]
b) templos de qualquer culto;
c) o patrimônio, a renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, observados os requisitos fixados na Seção II deste Capítulo;    
[...]
Art. 14. O disposto na alínea c) do inciso IV do artigo 9º é subordinado à observância dos seguintes requisitos pelas entidades nele referidas:
I – não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título;    
II - aplicarem integralmente, no País, os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais;
III - manterem escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.

Esses dispositivos do CTN mencionam condições objetivas que devem ser atendidas, para que as entidades possam usufruir da imunidade tributária. Os requisitos a serem preenchidos são três: I – não distribuir lucros ou parcela de seu patrimônio; II – aplicar de forma integral os recursos no País e na manutenção dos objetivos institucionais, vendando assim a remessa ao exterior; III - manter escrituração regular que assegure sua exatidão.     

Cumpre fazer uma importante distinção quanto à incidência desses requisitos. Observa-se que o art. 14, do CTN, acima transcrito, não está se referindo aos “templos de qualquer culto”, mencionados na alínea “b”, inc. IV, do art. 9º. Está sim apontando no sentido de que tais exigências se aplicam exclusivamente às instituições elencadas na alínea “c”, inc. IV, art. 9º, quais sejam: os partidos políticos, entidades sindicais dos trabalhadores, instituições educacionais e de assistência social sem fins lucrativos.

Da possibilidade de remeter valores ao exterior

Fica evidente que os requisitos constantes do art. 14, do CTN, não se aplicam aos “templos de qualquer culto”. Desse modo, as instituições que se enquadram na condição de templos religiosos não se sujeitam à restrição de aplicar os seus recursos integralmente em nosso país. Essas instituições religiosas podem fazer a remessa de valores ao exterior, visando prover o sustento de missionários enviados para qualquer parte do mundo, onde os mesmos prestam serviços religiosos vinculados à instituição Brasileira, sem que isso acarrete qualquer prejuízo à imunidade tributária.  

Ressalta-se que a Lei nº 9.532, de 10 de dezembro de 1997, que altera a legislação tributária federal e dá outras providências, instituiu também alguns requisitos para a fruição da imunidade tributária prevista no art. 150, da Constituição Federal. No entanto, esse Diploma Legal não estabeleceu qualquer condição a ser cumprida pelos templos religiosos. A Lei em destaque impôs algumas obrigações a serem cumpridas apenas pelas instituições educacionais e de assistencial social, conforme consta no seu art. 12, caput e § 2º, abaixo transcritos:  

Art. 12. Para efeito do disposto no art. 150, inciso VI, alínea "c", da Constituição, considera-se imune a instituição de educação ou de assistência social que preste os serviços para os quais houver sido instituída e os coloque à disposição da população em geral, em caráter complementar às atividades do Estado, sem fins lucrativos.       
[...]
§ 2º Para o gozo da imunidade, as instituições a que se refere este artigo, estão obrigadas a atender aos seguintes requisitos:
a) [...]
b) aplicar integralmente seus recursos na manutenção e desenvolvimento dos seus objetivos sociais;

Acrescenta-se que o Decreto nº 9.580, de 22 de novembro de 2018, que Regulamenta a tributação, a fiscalização, a arrecadação e a administração do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza, mencionou a imunidade tributária Constitucional concedida aos templos religiosos, referindo-se também ao Código Tributário Nacional. Contudo, não impôs qualquer condição a essas entidades religiosas para gozar dessa imunidade. O Regulamento anexo ao referido Decreto, no art. 179, assim preconiza:

Templos de qualquer culto
Art. 179.  Não ficam sujeitos ao imposto sobre a renda os templos de qualquer culto (Constituição, art. 150, caput, inciso VI, alínea “b”; e Lei nº 5.172, de 1966 - Código Tributário Nacional, art. 9º, caput, inciso IV, alínea “b”).

Nessa mesma linha, destaca-se o Decreto nº 6.306, de 14 de dezembro de 2007, que Regulamenta o Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguro, ou relativas a Títulos ou Valores Mobiliários – IOF. Esse Decreto, no art. 2º, § 3o, excluiu as entidades religiosas da obrigação de pagar o IOF, desde que as operações realizadas por essas entidades estejam vinculadas às suas finalidades essenciais.

§ 3o  Não se submetem à incidência do imposto de que trata este Decreto as operações realizadas por órgãos da administração direta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e, desde que vinculadas às finalidades essenciais das respectivas entidades, as operações realizadas por:
I - autarquias e fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público;
II - templos de qualquer culto;
III - partidos políticos, inclusive suas fundações, entidades sindicais de trabalhadores e instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei. (grifamos)

Conclui-se que não há na legislação complementar qualquer proibição no sentido de impedir as entidades religiosas de enviar recursos ao exterior. Portanto, podem remeter valores a fim de atender atividades desenvolvidas no exterior, desde que esses serviços estejam relacionados com as finalidades estatutárias da instituição religiosa. 

Da organização religiosa favorecida pela imunidade tributária

A imunidade tributária concedida aos templos religiosos não se sujeita ao cumprimento de nenhum requisito estabelecido em lei complementar. Por essa razão é de suma importância realçar a correta interpretação que se deve atribuir à expressão “templos de qualquer culto”, constante da alínea b, inc. VI, art. 150, da Constituição Federal.

O Código Civil, instituído pela Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, refere-se a essas entidades com a nomenclatura de “organizações religiosas” (art. 44, inc. IV). Esse Código, porém, não apresenta elementos conceituais capazes de estabelecer uma correlação exata entre essa nomenclatura e aquela expressão Constitucional, muito embora os templos de qualquer culto adquiram personalidade jurídica com a nomenclatura de “organizações religiosas”. 

O vetor interpretativo deve ser o disposto no § 4º do art. 150, da própria Constituição Federal. Esse preceito não restringe a imunidade tributária apenas ao “templo” onde se realiza “culto”, como poderia sugerir o teor da alínea b, inc. VI, art. 150, da Constituição Federal. Ao contrário disso, o referido § 4º estende a imunidade tributária para alcançar o patrimônio, a renda e os serviços, desde que estejam relacionados com as finalidades essenciais da entidade religiosa, ampliando assim o alcance interpretativo da expressão “templos”.

A par dessa compreensão ampliativa, o conceito de “templos de qualquer culto” para fins de imunidade tributária deve ter os seguintes contornos: são as entidades com personalidade jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, identificadas como “organizações religiosas”, que realizam cultos em templos ou em qualquer outro local, empregando patrimônio, renda e serviços integralmente na consecução das suas finalidades institucionais. São entidades que viabilizam condições necessárias ao livre exercício dos cultos religiosos, concretizando dessa forma a garantia da liberdade de consciência e de crença, direitos fundamentos previstos no art. 5º, inc. VI, da Constituição Federal.  

Por força dessa amplitude conceitual, devem ser considerados como templo por extensão, todos os demais locais onde a instituição realiza os seus cultos ou desenvolve os serviços religiosos. São consideradas também locais de culto todas as dependências integrantes do patrimônio utilizadas nas atividades essenciais da organização religiosa.

Salienta-se que esses locais de atividades e serviços religiosos podem estar situados no País ou no exterior. Existem várias entidades religiosas aqui situadas que criaram igrejas em outros países, onde Missionários ou Obreiros prestam serviços eclesiásticos em nome da organização religiosa que os enviou, cuja instituição faz a remessa de valores para o sustento desses religiosos, bem como para a manutenção dos templos e suas dependências. 

Por tudo isso é de suma importância fazer constar no Estatuto da organização religiosa, dentre as suas finalidades institucionais, a de manter financeiramente Missionários, Pastores, Obreiros ou Igrejas no exterior. Esse dispositivo estatutário tem por finalidade estabelecer o vínculo jurídico formal com a atividade fora do país, legitimando a remessa de valores ao exterior, onde a igreja desenvolve também as suas atividades e serviços religiosos.      

Por fim, conclui-se que as entidades que realizam cultos religiosos, dedicando integralmente o patrimônio, a renda e os serviços, no cumprimento das suas finalidades essenciais como organização religiosa, gozam da plena imunidade tributária estabelecida pela Constituição Federal. Além disso, essas instituições não estão sujeitas às restrições que impedem fazer a remessa de valores ao exterior, cuja operação de remessa deve ser igualmente alcançada pela desoneração tributária, pois essas instituições desenvolvem também serviços eclesiásticos no exterior, vinculados por força de disposição estatutária.

quarta-feira, 14 de novembro de 2018

A ORAÇÃO DE BOLSONARO E O ESTADO LAICO


Título original: O ESTADO É LAICO GRAÇAS A DEUS.

Por: Ronaldo Vasconcelos.

É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I – Estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público; (Art. 19 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988)

Estado laico: definição e surgimento

O desenvolvimento do conceito de Estado laico como fato moderno depende fundamentalmente do cristianismo. Ele tem suas raízes especialmente no movimento reformado do século XVI e XVII. O reformador João Calvino, por exemplo, afirmava a distinção entre reino espiritual e reino político da seguinte forma: “Temos que considerar cada uma dessas coisas em si, segundo as distinguimos: com independência uma da outra”.[1] Para Calvino, há leis específicas que regem cada uma dessas áreas; cada um desses reinos é constituído por Deus para governar aspectos distintos da vida.

Naquela época, o poder papal mantinha um duplo mandato, político e religioso. Foram os reformadores que efetivamente colocaram em xeque essa união. Compreendiam que Deus é soberano sobre os dois mandatos, mas ambos são distintos por lidarem com aspectos diferentes da sociedade.

Além disso, o movimento reformado foi fundamental para a formação futura das democracias republicanas modernas, como, por exemplo, a Inglaterra e os Estados Unidos. Visto que um governo totalitário busca unir as duas esferas de poder (espiritual e política), transformando o Estado em religião, a separação desses poderes é um dos grandes empecilhos para o totalitarismo. Por causa disso, o cristianismo sempre será um grande inimigo das ditaduras e dos governos totalitários.

O Brasil é um país de grande maioria cristã. A nossa constituição reconhece isso quando afirma que ela foi promulgada “sob a proteção de Deus”. Essa expressão tem grande fundamento histórico, mas é preciso reconhecer que há uma explicação teológico-filosófica por trás dela.

Foram justamente os adoradores do Deus cristão que asseguraram as liberdades elencadas na constituição. Somente em uma sociedade influenciada por uma cosmovisão que acredita em um Deus pessoal, triúno e distinto da natureza é possível vislumbrar os aspectos morais absolutos que regem essa sociedade, independente da relação direta com esse Deus.

Em outras palavras, os conceitos de dignidade da vida, democracia e laicidade que conhecemos estão amparados pela noção de uma humanidade criada com dignidade inerente, moralmente livre e plural. Não é necessário acreditar no Deus cristão para ser beneficiado por essa sociedade, mas uma vez que seus fundamentos basilares são retirados, a consequência será a sua ruína.

Por isso, com exatidão, definiu o ilustríssimo jurista Dr. Ives Gandra Martins: “Estado laico é aquele em que as instituições religiosas e políticas estão separadas, mas não é um Estado em que só quem não tem religião tem o direito de se manifestar. Não é um Estado em que qualquer manifestação religiosa deva ser combatida, para não ferir suscetibilidades de quem não acredita em Deus.” [2]

Laicismo vs. Estado laico

Em seu livro Imaginação Totalitária, o filósofo Francisco Razzo trata da imaginação totalitária como tendo o seu ápice no desejo último de “glorificar o poder do Estado como detentor do monopólio não do uso legítimo da violência, mas do monopólio simbólico da verdade absoluta e da imortalidade, portanto, da experiência última da ordem final e, consequentemente, da decisão de vida e a morte”.[3]

A origem disso está na crença da autonomia da razão, que pressupõe ser ela capaz de dar conta da realidade com neutralidade e independência das crenças religiosas.[4] Essa suposta razão terá o Estado como manifestação máxima e, consequentemente, o Estado será a expressão mais elevada da sociedade. Ele será o único capaz de proporcionar ao indivíduo as suas liberdades, devendo assim, intervir na família, relações comerciais, educação e outras instituições, como o critério (supostamente) racional que dá significado e coerência ao todo da sociedade.[5]

É exatamente isso que ocorre no chamado laicismo, quando a religião é relegada à vida privada e o Estado não só não é religioso, mas também deve coibir as manifestações públicas religiosas. A importância da religião é definida pelo indivíduo em sua vida privada, enquanto que, para o Estado, é tratada negativamente, portanto não tem espaço público. Esse laicismo, herdado pelo Iluminismo e Revolução Francesa, pais de todos os governos totalitários da modernidade, é aplicado na França.

Brasil e Estado laico

No Brasil, por outro lado, se reconhece o valor da religião para o indivíduo e para a própria fundação do Estado. Não é à toa que símbolos cristãos podem ser encontrados em repartições públicas, num reconhecimento de que o Estado brasileiro é devedor da religião cristã. Nada disso afeta a laicidade adotada pelo Brasil, pois a manifestação religiosa não é somente um direito do cidadão, como também é um aspecto da humanidade.

Isso pode ser atestado com o artigo 19 da Constituição. Esse artigo salvaguarda o direito ao culto, ainda que esclareça que o culto nunca deve ser estatal. De outra sorte, o Estado poderá, quando achar por bem, ter uma aliança de colaboração com os grupos religiosos para o interesse público. Isso significa que as igrejas podem ser ouvidas para ajudar o Estado a administrar determinadas áreas.

Essa “humildade” estatal é fundamental para a distinção entre Estado e Igreja. Isso porque o Estado não estaria se sobrepondo sobre as instituições eclesiásticas, as famílias, as relações comerciais, etc. O Estado é, ao invés disso, uma esfera de soberania distinta (para usar o conceito do pastor holandês Abraham Kuyper), administrada por leis próprias, tal como outras instituições.

A recente discussão sobre a oração incluída no primeiro ato de pronunciamento do presidente eleito Jair Messias Bolsonaro[6] precisa levar em consideração a liberdade religiosa e de manifestação, mesmo de uma figura pública. A oração em nada afeta a laicidade do Estado; pelo contrário, a garante. Ao demonstrar que ele, o presidente eleito, está submisso a Deus e comprometido com a verdade da sua Palavra, Bolsonaro faz menção ao seu compromisso com a democracia, a justiça e o bem-estar do cidadão. Por meio da oração, o presidente eleito está definindo o Estado como uma das instituições da sociedade, mas não a mais importante.
[1] CALVINO, João. Institutas. 3.XIX.15.
[2] Disponível em: https://www.conjur.com.br/2012-nov-26/ives-gandra-estado-laico-nao-estado-ateu
[3] RAZZO, Francisco. Imaginação Totalitária: Os Perigos da Política como Esperança. São Paulo: Record, 2016, p. 241.
[4] Para ver a refutação desta crença veja DOOYEWEERD, Herman. Crepúsculo do Pensamento Ocidental. Brasília: Monergismo, 2018.
[5] Veja mais sobre isso em DOOYEWEERD, Herman. Estado e Soberania: Ensaios sobre Cristianismo e Política. São Paulo: Vida Nova, 2014, p. 39-96.
[6] Disponível em: https://www.revistaforum.com.br/cria-um-pouco-de-preocupacao-diz-miriam-leitao-sobre-oracao-de-bolsonaro/

Fonte: Voltemos ao Evangelho. Website: voltemosaoevangelho.com

sexta-feira, 26 de outubro de 2018

O AMOR E O ÓDIO: QUEM AMA, ODEIA


Por Rev. Alan Rennê Alexandrino Lima.
Foi realizado hoje, 25/10, um "culto de oração", organizado por um grupo de evangélicos de orientação esquerdista, apoiadores de Fernando Haddad. A programação teve como tema "O Amor Vence o Ódio".
O tema foi escolhido em função do atual clima político do Brasil, e parte do pressuposto que os eleitores de Jair Bolsonaro são apoiadores de alguém que pratica o que, hoje em dia, é chamado de "discurso de ódio". Qualquer afirmação que contrarie o que a agenda esquerdista propõe é, imediatamente, rotulada como "discurso de ódio". Como bem observou o Pr. Augustus Nicodemus, "aquilo em que acreditamos começa a ser rotulado de ódio. Se afirmarmos a família, temos ódio contra os homossexuais; se afirmarmos a vida, somos contra a mulher que tem o direito do aborto; se afirmarmos a defesa própria, é discurso de ódio contra os criminosos, porque deve haver direitos iguais" (Caminhos da Fé. p. 41).
A incoerência do discurso dos evangélicos progressistas está em que, sua mensagem é a de que o ódio é, intrínseca e moralmente, errado. Se alguém diz ser discípulo de Jesus, então, a única coisa que lhe cabe é o amor. Não obstante, qual é o sentimento que, na prática, é nutrido e posto em obras da parte dos progressistas para com aqueles que, de acordo com eles, praticam o "discurso de ódio"? Amor? Tolerância? Não. Longe disso! É ódio! E o ódio se traduz, de modo claro, em agressões, insultos e até mesmo espancamentos. Hoje mesmo, aqui em São Luís, ao tentar apresentar uma palestra sobre o que é o fascismo, um católico conservador foi objeto do ódio de universitários esquerdistas, que o xingaram, cuspiram e pouco faltou para que o agredissem fisicamente.
Um segundo problema com o discurso progressista de que "o amor vence o ódio" é o pressuposto de que amor e ódio são mutuamente excludentes. Quem ama não odeia. E quem odeia não ama. Alguém cheio de ódio é alguém vazio de amor, e vice-versa. Se eu me coloco de modo contrário à ideologia de gênero, é porque eu não amo gays, lésbicas, transsexuais etc. Pelo contrário, eu os odeio. Esta é a lógica da esquerda evangélica.
Há um dito atribuído a Érico Veríssimo, que diz assim: "O oposto do amor não é o ódio, mas a indiferença". Eu sou inclinado a concordar com a afirmação inicial. O oposto do amor não é o ódio. De modo bem interessante, em 1Coríntios 13, não encontramos a declaração de que o amor não odeia. O apóstolo Paulo diz sobre o amor: "O amor é paciente, é benigno; o amor não arde em ciúmes, não se ufana, não se ensoberbece, não se conduz inconvenientemente, não procura os seus interesses, não se exaspera, não se ressente do mal; não se alegra com a injustiça, mas regozija-se com a verdade; tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta" (vv. 4-7). Perceba, o ódio não figura entre as posturas e sentimentos incompatíveis com o amor.
Existem algumas passagens nas quais amor e ódio são mencionados e, aparentemente, figuram como antagônicos entre si. No Salmo 109.5 está escrito: "Pagaram-me o bem com o mal; o amor, com ódio". Esta passagem é suficientemente clara. Amor e ódio não são antagônicos um ao outro. O que está sendo afirmado aqui é apenas o princípio por trás da conhecida regra de ouro: Faça aos outros aquilo que você quer que façam a você. Se você tem sido beneficiado com o amor de alguém, então, retribua com amor. Se alguém te faz o bem, retribua com o bem, não com mal. Em Provérbios 10.12 está escrito: "O ódio excita contendas, mas o amor cobre todas as transgressões". Nesta passagem, amor e ódio também não devem ser vistos como inimigos. O que o autor está afirmando é o princípio envolvido no ódio pecaminoso, gratuito. Para poder interpretar esta passagem como que ensinando que amor e ódio são absolutamente incompatíveis, eu necessito partir do pressuposto que todo e qualquer ódio é, por necessidade, pecaminoso, mal, vil, perverso, maligno. No entanto, as Escrituras não me permitem fazer isso.
Em Apocalipse 2.6, um dos elogios que Jesus faz à igreja de Éfeso foi o seguinte: "Tens, contudo, a teu favor que odeias as obras dos nicolaítas, as quais eu também odeio". De antemão afirmo que o versículo está traduzido da maneira correta. O verbo grego miséô signifca mesmo "odiar". Existem algumas passagens neotestamentárias em que o verbo assume o significado de "amar menos", como em Lucas 14.26. No caso, o verbo faz uma comparação entre nossa afeição a Deus, que deve estar acima de tudo e de todos, e nossa afeição aos nossos pais, irmãos, filhos etc. Mas em Apocalipse 2.6 o objeto do verbo é o pecado. No caso, "as obras dos nicolaítas", que nada mais eram do que a imoralidade, a idolatria e a perversão da verdade, como nos diz Simon Kistemaker (Apocalipse. p. 159). G. K. Beale faz o seguinte comentário sobre "as obras dos nicolaítas": "Provavelmente os nicolaítas ensinavam que os cristãos poderiam participar da cultura idólatra de Éfeso. A cidade fora dominada pelo culto à deusa Artemis, deusa da fertilidade, e seu templo tinha milhares de sacerdotes e sacerdotisas com pesado envolvimento na prostituição" (Revelation: A Shorter Commentary. p. 57). Dessa forma, Jesus não está elogiando a igreja de Éfeso por "amar menos" aquilo que é pecaminoso. Em vez disso, Jesus aprova que aqueles cristão, de modo ativo e intenso, detestem o pecado ensinado e promovido pelos nicolaítas. Ademais, que os evangélicos esquerdistas atentem bem para isto:Jesus diz: "eu também odeio". Jesus odeia. E nem preciso dizer que em Jesus não existe pecado, não é mesmo?
Em 1João 4.20 a Palavra de Deus diz: "Se alguém disser: Amo a Deus, e odiar a seu irmão, é mentiroso; pois aquele que não ama a seu irmão, a quem vê, não pode amar a Deus, a quem não vê". O princípio é óbvio: quem ama a Deus também ama a seu irmão. Quem odeia a seu irmão, não ama a Deus. Quem odeia a seu irmão também odeia a Deus. A pergunta é: quem é o meu irmão? Não vou entrar na questão da paternidade de Deus, pois aqui já temos informação suficiente para que os evangélicos esquerdistas rilhem os seus dentes por longos anos.
O fato é que o ódio também pode ser compreendido como uma função do amor. Sim, é isto mesmo que você leu. O ódio é uma função do amor. Ora, qualquer coisa que coloque sob ameaça aquilo que é o objeto da minha afeição mais elevada, do meu amor mais intenso, será, automaticamente, objeto do meu ódio, da minha repulsa mais intensa. De igual modo, se eu amo a pureza, então, eu também odiarei a impureza. Se eu amo a santidade, odiarei a iniquidade. Se amo a justiça, odiarei a injustiça. Por amar a Deus acima de todas as coisas, qualquer coisa que ofenda ao objeto do meu amor será objeto do meu ódio. Como Davi, no Salmo 139, pôde dizer que odiava com ódio consumado determinadas pessoas? Ele explica: "Não aborreço eu, SENHOR, os que te aborrecem? E não abomino os que contra ti se levantam? Aborreço-os com ódio consumado; para mim são inimigos de fato" (vv. 21-22). Davi não odiava quem o odiava. Davi odiava quem odiava aquele a quem ele amava de todo o seu coração. Mas nem por isso ele se dava por justificado. Ele, sabendo da inclinação do seu coração, ainda pediu a Deus o sondasse e o livrasse de todo e qualquer caminho mau (vv. 23-24).
O nosso grande perigo é odiarmos aquilo que deve ser objeto do nosso amor e amarmos aquilo que devemos odiar. Quando o Senhor inicia em nós o processo de santificação, ele está nos moldando segundo a imagem de Jesus (Romanos 8.29), a fim de amarmos cada vez mais aquilo que é amável e odiarmos cada vez mais aquilo que é odioso. Por amarem tanto uma ideologia, esquerdistas odeiam aqueles que defendem a fé cristã histórica.
Quem ama a Deus, odeia o pecado.
Fonte: perfil do autor no facebook.


quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

A IGREJA DENTRO DA LEI - Controle de Normas Estatutárias de Igreja Sede, Ministério ou Convenção

Por Adiel Teófilo.

As igrejas evangélicas em nosso país podem funcionar de forma independente umas das outras, mas também podem estabelecer vínculos entre si formando instituições coletivas. Assim, do ponto de vista da autonomia administrativa, estão organizadas basicamente de duas formas distintas, descritas a seguir.
Das igrejas autônomas e das igrejas vinculadas
As igrejas autônomas são aquelas que foram criadas com personalidade jurídica própria e funcionam com absoluta independência em relação às demais. Não possuem qualquer vinculação administrativa ou eclesiástica com outras instituições religiosas, ainda que utilizem denominação evangélica idêntica por comungarem do mesmo credo religioso.
As igrejas vinculadas foram criadas de modo integrado a uma denominação, formando um só grupo de igrejas filiadas, chamadas também de congregações, as quais podem ter ou não personalidade jurídica própria, porém estão subordinadas a uma igreja sede ou matriz. Esta, por sua vez, exerce o controle administrativo, financeiro e patrimonial sobre as igrejas filiadas, em razão de disposições estatutárias instituídas originariamente na criação dessas unidades vinculadas.  
Da liberdade de filiação
Importante analisar a condição das igrejas em face da liberdade de filiação. As igrejas autônomas possuem ampla liberdade de filiação. Podem estabelecer vínculos com outras instituições, mas também podem a qualquer momento romper com essas ligações, promovendo a sua desfiliação. Isso, em razão do princípio da liberdade associativa, previsto no art. 5º, inc. XX, da Constituição Federal/1988 (CF/88), que assegura: ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado;”.
Ao contrário disso, as igrejas vinculadas têm certas restrições. Não podem por iniciativa própria promover o desligamento em razão dos vínculos originários da sua criação como parte integrada ao todo. A autonomia somente poderá ser concedida por iniciativa da sede ou matriz, desde que observado o procedimento previsto em estatuto ou em ata deliberativa do órgão competente para conceder a autonomia. Exemplo disso, ao empresário que instituir sucursal, filial ou agencia da empresa é que cabe destituir ou repassa-la a terceiro.
Do estatuto único e da pluralidade de estatutos
Por outro lado, o conjunto de igrejas vinculadas entre si pode ser organizado em entidade de representação coletiva designado por ministério ou convenção. Considerando a quantidade e a localização dessas igrejas filiadas, as convenções ou ministérios podem ser de âmbito regional, estadual ou nacional. No que concerne ao estatuto dessas organizações coletivas, podem ocorrer duas hipóteses.
Convenção ou ministério que possui estatuto único. Nesse caso, as normas estatutárias são aplicadas a todas as igrejas e congregações vinculadas, as quais não possuem individualmente estatuto nem personalidade jurídica própria. Juntas, formam uma só organização religiosa, simultaneamente com a igreja sede ou matriz, de modo que todas as entidades vinculadas utilizam o mesmo Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ), por se sujeitarem a um mesmo estatuto.  
No caso de pluralidade de estatutos, cada igreja local tem seu estatuto e personalidade jurídica própria, distinta das demais. No entanto, o estatuto de cada igreja filiada contém normas que estabelecem a natureza da vinculação com a igreja central, conforme critérios originariamente instituídos no estatuto da entidade coletiva. Dessa forma, cada igreja filiada tem seu próprio CNPJ.
Do conflito de normas estatutárias
Ocorrendo a pluralidade de estatutos, cada igreja filiada elabora seu próprio ato constitutivo. Nesse caso podem ocorrer conflitos de normas entre o estatuto da igreja local e o estatuto da entidade de representação coletiva. Surge então a necessidade de se exercer o controle de normas estatutárias, visando promover a adequação entre as disposições do estatuto local e os preceitos estatutários de âmbito geral.   
Embora casos dessa natureza não sejam tão comuns no cotidiano das igrejas, podem surgir em qualquer denominação. Como exemplo, ocorreu uma situação de conflito estatutário envolvendo uma Convenção Estadual no Nordeste do país, quando auxiliamos na resolução mediante a elaboração de parecer jurídico. Esse fato ensejou a redação do presente artigo, sendo aqui reproduzidas as principais orientações contidas no aludido parecer.
Dos vínculos entre igrejas filiadas e igreja sede, ministério ou convenção
Diante do conflito de normas estatutárias, faz-se necessário preliminarmente identificar a natureza dos vínculos existentes entre a igreja filiada, que editou a norma conflitante, e a sede, convenção ou ministério, que possui ascendência sobre aquela filiada. O exame cuidadoso do estatuto e das atas anteriores, desde a data em que foram criadas as instituições, pode oferecer histórico com subsídios concretos capazes de demonstrar a vinculação jurídica existente entre as entidades religiosas.
Esses vínculos devem constar expressamente do estatuto e podem apresentar diferentes naturezas, conforme foram estabelecidos na origem entre as igrejas filiadas e a respectiva entidade coletiva. Seguem alguns exemplos de vínculos: 1) administrativos: para fins de controle da gestão administrativa, financeira e patrimonial; 2) eclesiásticos: visam a formação, ordenação e movimentação de Pastores, Obreiros e demais líderes, bem como a unidade teológica e doutrinária da denominação; e, 3) colaborativos: com vistas ao apoio e auxílio mutuo entre as igrejas ligadas por laços de fraternidade e cooperação.
Convém ressaltar que as igrejas são livres para estabelecer qualquer desses vínculos ou todos eles simultaneamente. Além disso, tais vínculos podem apresentar maior ou menor abrangência no âmbito da instituição religiosa. Tudo depende da forma de organização administrativa e eclesiástica que foi instituída pela entidade de representação coletiva, que preestabelece os parâmetros da vinculação por meio de normas estatutárias gerais. Essas normas são de cumprimento obrigatório por parte das igrejas filiadas e se constituem no principal fundamento jurídico para viabilizar o controle de adequação das normas estatutárias em conflito. A título de exemplo dessas normas gerais, transcreve-se a seguir disposições extraídas do Estatuto da Convenção Estadual onde ocorreu o conflito estatutário que mencionamos acima:
Art. 11. Os Estatutos e Regimentos Internos das Igrejas filiadas disporão sobre o seu vínculo com a Convenção [...], em nível estadual, e, com a Convenção [...], em nível nacional.
[...]
§ 3o Os Estatutos e Regimentos das Igrejas filiadas e instituições reconhecidas, não poderão contrariar disposições estatutárias e regimentais da Convenção [...].
Do controle de adequação das normas estatutárias e do procedimento
Identificados os vínculos e sua natureza, o passo seguinte é apontar com precisão os dispositivos inseridos no estatuto da igreja filiada que apresentam contrariedade em face das normas estatutárias da entidade de representação coletiva. Pode-se elaborar nesse sentido parecer jurídico esclarecendo minuciosamente as disposições que devem ser impugnadas em razão da contrariedade, bem como os preceitos estatutários da organização coletiva que em tese foram violados.
De posse desse documento de consultoria jurídica, a sede, ministério ou convenção, pode instaurar procedimento administrativo interno visando promover a análise e o julgamento da adequação das normas estatutárias em conflito. Ainda que o estatuto ou o regimento interno não disponha expressamente acerca desse procedimento de controle, nada obsta a sua instauração pela instituição colegiada. Trata-se de medida administrativa exercida com a finalidade de fazer cumprir integralmente o seu próprio estatuto, corrigindo excessos ou desvios cometidos por igreja filiada na elaboração ou reforma do estatuto vinculado. 
Convém destacar que durante todo o procedimento de controle devem ser assegurados todos os meios legítimos de defesa, conforme estabelece o art. 5º, inc. IV, da CF/88: aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;”.
Instaurado o procedimento de controle de adequação das normas estatutárias, a igreja filiada deve ser cientificada na pessoa do seu presidente ou representante legal. A comunicação por escrito conterá os dados que se seguem, dentre outros considerados relevantes:
a) informações sobre a instauração do sobredito procedimento de controle e sua finalidade;
b) indicação precisa das normas ou expressões contidas no estatuto da igreja filiada que estão sendo impugnadas por apresentar contrariedade ao estatuto da sede, ministério ou convenção, apontando ainda quais são as disposições que em tese foram violadas;
c) fixação de prazo razoável para o oferecimento de defesa escrita por parte da igreja filiada; e,
d) advertência de que a falta dessa resposta no prazo fixado implicará em revelia.
Apresentada ou não a resposta escrita, deve-se prosseguir na instrução do procedimento. Para isso, convém juntar documentos, tomar depoimentos se preciso for e adotar outras medidas necessárias ao completo esclarecimento do caso. E aqui cabe recordar que visando assegurar a ampla defesa e o contraditório, a igreja filiada deve ser intimada de cada uma das providências realizadas no decorrer da instrução do procedimento.
Vencida essa fase, segue-se o julgamento. O procedimento será cuidadosamente analisado e a decisão final proferida pelo órgão competente. Para tanto, precisa declarar se aquelas normas inicialmente impugnadas apresentam ou não contrariedade em face do estatuto da entidade coletiva. Pode declarar ainda, caso oportuno e conveniente, a ineficácia das normas impugnadas, com efeito ex tunc - significa dizer que as normas declaradas contrárias ao estatuto perdem a sua eficácia desde a data da sua edição, não produzindo desde então os efeitos que pretendiam produzir.       
O inteiro teor dessa decisão final constará em ata, que será levada ao registro público em Cartório. Esse ato visa assegurar a publicidade da decisão, para que produza os jurídicos e legais efeitos. Cópia dessa ata com registro será encaminhada à igreja filiada, para conhecimento e adoção de medidas visando sanar as contrariedades apontadas, com a fixação de prazo razoável para promover as reformas no seu estatuto. Caso isso não ocorra no prazo fixado, a sede, ministério ou convenção, poderá intervir diretamente na igreja filiada através da aplicação de mecanismos estatutários ou regimentais, ou ainda, na ausência desses mecanismos ou impossibilidade de sua aplicação, propor ação judicial por intermédio de advogado exigindo a efetivação da reforma e adequação estatutária.   

Diante do exposto, conclui-se que a organização religiosa de representação coletiva exerce controle sobre as entidades a ela filiadas. Isso decorre de diferentes vínculos jurídicos, históricos e institucionais, originariamente estabelecidos entre elas. A natureza dessa vinculação pode determinar inclusive que certas igrejas filiadas tornem-se indissociáveis, bem como obrigar que os seus atos constitutivos guardem conformidade com as disposições estatutárias gerais. Surgindo alguma norma que fere a vinculação ou apresente contrariedade total ou parcial em face dos preceitos estatutários gerais, a igreja sede, ministério ou convenção, tem o poder-dever de adotar medidas visando sanar essas irregularidades. Enfim, poderá para tanto instaurar procedimento de controle de adequação das normas estatutárias, assim como empregar mecanismos estatutários e regimentais disponíveis ou buscar a tutela judicial específica quando necessário, a fim de fazer cumprir o seu estatuto e restabelecer a harmonia entre instituições religiosas vinculadas.