As
igrejas em nosso país usufruem relativamente bem do direito ao livre exercício
dos cultos religiosos, no entanto muitas não conhecem e nem aplicam adequadamente
o direito de associação. É preciso conhecê-lo melhor, através da legislação em
vigor, a fim de fazer valer todas as prerrogativas legais no âmbito das atividades
eclesiásticas.
Existem
diversas atividades desenvolvidas pelas igrejas que podem ser aprimoradas e até
mesmo ampliadas, por meio de uma associação instituída para se dedicar exclusivamente
a essas finalidades. Podemos citar como exemplo, as atividades de assistência social,
educacional, recuperação de viciados, atividades evangelísticas e missionárias,
dentre outras. As associações voltadas para esses fins podem ser constituídas
por membros e congregados da própria igreja, além de pessoas da comunidade,
conforme critérios a serem estabelecidos no Estatuto.
Há igrejas, principalmente
localizadas em grandes centros urbanos, que possuem membros capacitados, recursos financeiros disponíveis e espaços físicos
que permanecem ociosos durante toda a semana. Apesar dessas disponibilidades, não desenvolvem nenhum
programa ou ação social, voltando-se apenas para os cultos semanais e o uso dominical de algumas salas, subutilizando assim o imóvel que poderia servir melhor à sociedade.
No
tocante ao direito de associação, a sua principal fonte é a Constituição Federal de 1988. No seu artigo 5º, incisos XVII a XXI, estão previstas
as garantias fundamentais para o exercício desse direito na vida em sociedade:
o inciso XVII assegura que “é plena a
liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar;”; o inciso seguinte afirma que é
livre a criação de associações, sendo que o Estado não pode interferir no seu
funcionamento; o inciso XIX
estabelece que as atividades das associações só podem ser suspensas por força
de decisão judicial, e a dissolução compulsória das associações só pode ocorrer
após sentença judicial transitada em julgado, isto é, sentença que não cabe
mais recurso; o inciso XX garante
importante liberdade individual: “ninguém
poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado;”; e o inciso XXI preconiza que “as entidades associativas, quando
expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados
judicial ou extrajudicialmente;”.
O artigo 5º, inciso LXX, da Constituição
Federal, institui outra garantia em favor das associações. Prescreve que a associação
legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano poderá impetrar
o mandado de segurança coletivo, em defesa dos interesses dos seus associados. Convém
ressaltar, para o exercício dessa prerrogativa, que no estatuto poderá constar autorização
expressa para a associação representar os seus filiados judicial e
extrajudicialmente, conforme dispõe o inciso XXI, acima transcrito.
Existem
ainda no texto Constitucional outras disposições relacionadas ao tema. O artigo 29, inciso XII, preceitua que a
Lei Orgânica do Município deverá conter, dentre outras disposições, mecanismo
que assegure a cooperação das associações representativas no planejamento
municipal. No artigo 74, § 2º, está
previsto que “Qualquer cidadão, partido
político, associação ou sindicato é parte legítima para, na forma da lei,
denunciar irregularidades ou ilegalidades perante o Tribunal de Contas da
União.”.

As disposições
gerais relativas à criação das associações constam dos artigos 45 a 52, do Código Civil. Destaca-se dentre essas disposições,
que a existência legal das pessoas jurídicas de
direito privado começa com a inscrição do ato constitutivo, que é o estatuto, no
Cartório de Registro das Pessoas Jurídicas da localidade onde a associação estabelecerá
a sua sede. Esse registro é efetuado com amparo no artigo 114, inciso I, da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, que
dispõe sobre os registros públicos. A
partir de então, deverão ser averbadas nesse Cartório todas as alterações promovidas
no estatuto.
O artigo 46 do Código Civil
enumera as informações que deverão constar do registro, a saber: “I - a denominação, os fins, a sede, o
tempo de duração e o fundo social, quando houver; II - o nome e a
individualização dos fundadores ou instituidores, e dos diretores; III - o modo
por que se administra e representa, ativa e passivamente, judicial e
extrajudicialmente; IV - se o ato constitutivo é reformável no tocante à
administração, e de que modo; V - se os membros respondem, ou não,
subsidiariamente, pelas obrigações sociais; VI - as condições de extinção da
pessoa jurídica e o destino do seu patrimônio, nesse caso.”. Consequentemente,
esses dados devem ser inseridos na ata de criação ou no estatuto da associação,
subscrito por Advogado, cujos documentos serão levados simultaneamente a
registro.
As regras específicas sobre as associações se encontram nos artigos 53 a 61, do Código Civil. O artigo 53 contém a definição legal: “Constituem-se as associações pela união de
pessoas que se organizem para fins não econômicos.”. O artigo seguinte especifica
os preceitos que devem constar do estatuto, sob pena de nulidade: “I - a denominação, os fins e a sede da
associação; II - os requisitos para a admissão, demissão e exclusão dos
associados; III - os direitos e deveres dos associados; IV - as fontes de recursos
para sua manutenção; V – o modo de constituição e de
funcionamento dos órgãos deliberativos; VI - as condições para a alteração das
disposições estatutárias e para a dissolução; VII – a
forma de gestão administrativa e de aprovação das respectivas contas.”.
Dentre as demais regras específicas, convém ressaltar as seguintes. O artigo 57 preconiza que
a exclusão do associado só é admissível havendo justa causa, assim reconhecida
em procedimento que assegure direito de defesa e de recurso. De acordo com o artigo 59 e seu Parágrafo único, compete
privativamente à assembleia geral dos associados, convocada especialmente para
estes fins, destituir os administradores e alterar o estatuto, conforme quórum
estabelecido no estatuto, o qual deverá prever ainda os critérios para a eleição
dos administradores. Conforme artigo 60,
deve ser garantido a 1/5 (um quinto) dos associados o direito de promover a convocação
dos órgãos deliberativos. E por fim, o artigo
61 estatui algumas regras para a hipótese da associação ser dissolvida por deliberação
dos associados.
Essas são as principais normas a serem observadas na criação e registro
de uma associação. Não obstante, outros Diplomais Legais podem ser aplicados às
associações, considerando sua finalidade e campo de atuação. Salienta-se nesse
sentido a Lei nº 9.790, de 23 de março
de 1999, que dispõe sobre os requisitos para a qualificação das pessoas
jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, como Organizações da
Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP, bem como institui e disciplina o
Termo de Parceria. Essa Lei foi regulamentada pelo Decreto nº 3.100, de 30 de junho de 1999.
Esse Termo de Parceria cuida-se de um instrumento a ser firmado entre as
entidades qualificadas como OSCIP e o Poder Público. Destina-se à formação de
vínculo de cooperação entre as partes, para o fomento e a execução das
atividades de interesse público previstas no artigo 3º da supracitada Lei. Dentre essas atividades destacamos as
seguintes: “promoção da assistência social; promoção gratuita da educação; promoção
gratuita da saúde; promoção da segurança alimentar e nutricional; promoção do voluntariado;
promoção do desenvolvimento econômico e social e combate à pobreza; experimentação,
não lucrativa, de novos modelos sócio-produtivos e de sistemas alternativos de produção,
comércio, emprego e crédito; e promoção da ética, da paz, da cidadania, dos
direitos humanos, da democracia e de outros valores universais;”. Como se percebe, tratam-se de áreas sociais, nas quais
as associações podem desenvolver relevante trabalho em parceria com o Poder
Público.
Diante
de todo o exposto, resta apenas enfatizar que as igrejas podem criar livremente
associações, com a precípua finalidade de desenvolver atividades sociais não
lucrativas. A criação dessas entidades com estrutura própria poderá contribuir
para aprimorar e até ampliar as ações e programas que certas igrejas
desenvolvem de forma incipiente ou improvisada. O campo social é
fértil e está branco para a ceifa. Falta apenas arregimentar os ceifeiros que
se disponham a trabalhar, desde membros mais novos até ministros religiosos
mais antigos. Porque a fé sem obras é morta.