“... se alguém administrar, administre segundo
o poder que Deus dá; para que em tudo Deus seja glorificado por Jesus Cristo, a
quem pertence a glória e poder para todo o sempre. Amém.” I Pedro 4.11
Por Adiel Teófilo.
A
maneira de administrar uma igreja não é igual a de uma empresa. No entanto, quando
se trata dos negócios terrenos, ainda que voltados para os interesses do Reino
de Deus, existem diversas semelhanças entre as duas formas de administração. Isso
porque as organizações religiosas, para realizar adequadamente seus negócios
financeiros e patrimoniais, precisam cumprir as disposições legais vigentes no
país, tal como as empresas. Aliás, quando se trata de uma igreja, o que se espera
na sua gestão administrativa é que o zelo e a correção sejam bem maiores que em
qualquer empreendimento empresarial.
Assim
sendo, existem atos, contratos e outros documentos jurídicos, utilizados por empresas
e também por particulares, que podem muito bem ser aplicados às organizações
religiosas. A finalidade no uso desses instrumentos é tornar a administração segura
e mais eficiente, resguardando os legítimos interesses da denominação
evangélica.
A
prática tem demonstrado que a falta de documentação adequada pode acarretar
consequências desagradáveis para os gestores e para as igrejas. Podemos
mencionar, dentre outras situações, prejuízos financeiros e patrimoniais, impossibilidade
de exigir o cumprimento de obrigação, dificuldades de provar o que realmente
foi pactuado com terceiros, além de desgastes emocionais e demandas judiciais
que poderiam ser evitadas.
Por essa razão, não
bastam boas intenções na gestão de negócios da igreja. E aqui talvez reside o
principal problema de vários administradores: fazer negócios apenas “de boca”,
confiando excessivamente nas pessoas, inclusive naqueles que se dizem cristãos,
como se todos fossem de fato convertidos. Logo, não convém tolerar situações de
informalidade, sem qualquer registro por escrito, nem celebrar todos os
contratos verbalmente, confiando na boa vontade de terceiros, esperando que cumpram
sempre as obrigações que assumiram. E cabe aplicar aqui as palavras de Jesus: “..., sede prudentes como as serpentes e símplices
como as pombas.” (Mateus 10.16).
Diante
disso, revela-se de suma importância formalizar as relações contratuais em
documento próprio. A finalidade primordial é assegurar o exercício de direitos,
bem como exigir o cumprimento de obrigações, além de proporcionar transparência
e credibilidade na prestação de contas. Na elaboração dos diversos documentos é
indispensável observar os requisitos previstos em lei, para que tenham validade
e produzam os efeitos jurídicos pretendidos pelas partes. Nesse sentido, pode
ser de grande valia a assistência de profissional da advocacia.
Dentre
as situações que podem ser melhor administradas nas organizações religiosas, destaca-se
a do trabalho voluntário. Há pessoas
que se apresentam, principalmente nas pequenas igrejas, para prestar voluntariamente
serviços de limpeza, zeladoria, dentre outros. Contudo, depois de algum tempo, passam
a exigir direitos trabalhistas, promovendo inclusive reclamação judicial para receber
verbas salariais, sob o argumento de que mantinham vínculo empregatício com a
igreja.
Para
corrigir essa situação, pode ser elaborado um Termo de Adesão ao Trabalho Voluntário, com amparo na Lei nº 9.608, de 18 de fevereiro de 1998. Por
meio desse documento, fica registrado que a atividade desempenhada em favor da
igreja é na condição de prestador de serviço voluntário, o que não gera vínculo
empregatício, nem obrigação de natureza trabalhista, previdenciária ou afim.
Ressalta-se que esse documento deve ser utilizado somente nos casos em que de
fato não há vínculo empregatício, isto é, quando o serviço é prestado
gratuitamente.
No
sobredito Termo de Adesão deverá constar qual é o serviço voluntário que a
pessoa desempenhará, bem como as suas atribuições, as quais podem estar previamente
definidas no Estatuto ou no Regimento Interno da igreja. Deverá conter ainda, a
assinatura do prestador de serviço voluntário, do pastor presidente ou do
administrador da igreja e de duas testemunhas que tenham presenciado a
lavratura do documento.
Por
outro lado, nos casos em que a igreja possui empregados, com jornada de trabalho, atribuições e salário previamente
fixados, o correto é firmar o contrato na Carteira
de Trabalho e Previdência Social (CTPS). Deve providenciar também o recolhimento
dos encargos trabalhistas e previdenciários que são devidos. Não é incomum
encontrar nas igrejas empregados que trabalham há vários anos sem qualquer
registro em carteira. A regularização da situação trabalhista propicia garantias
para ambas as partes, evitando a aplicação de multas e outros encargos para o
empregador e assegurando ao empregado o direito à aposentadoria, dentre outros
benefícios.
No
tocante aos contratos que podem ser utilizados
pelas igrejas, as possibilidade são inúmeras. Na verdade, todas as espécies de
contratos firmados entre particulares podem ser também celebrados pelas organizações
religiosas. Até mesmo porque as igrejas regularmente criadas possuem a natureza
de pessoa jurídica de direito privado, e, nessa condição, podem firmar todos os
contratos previstos na legislação que forem compatíveis com as suas
finalidades, além dos contratos atípicos, desde que observadas as normas gerais
fixadas no Código Civil – Lei nº 10.406,
de 10 de janeiro de 2002.
Dentre
os diversos contratos, menciona-se o de comodato
de imóvel. Aplica-se aos casos em que um imóvel é cedido gratuitamente para
servir de moradia a terceiro. Essa situação é encontrada, por exemplo, nos
locais onde o zelador ou alguém que toma conta do templo e das dependências
passa a residir em imóvel da igreja. Nesses casos é bastante comum tudo ser
feito apenas “de boca”, sem qualquer documento que oficialize a utilização. É comum
também surgir dificuldades futuras para reaver o imóvel, diante da recusa em
restituí-lo por razões as mais diversas. É recomendável, por conseguinte,
firmar o respectivo contrato, estipulando o prazo, as condições e as responsabilidades
referentes ao comodato.
Outro
contrato importante é o de locação de
imóvel, na hipótese da igreja utilizar como templo um imóvel alugado. As
regras pertinentes estão previstas na Lei
nº 8.245, de 18 de outubro de 1991, que dispõe sobre as locações dos
imóveis urbanos. A celebração do contrato por escrito assegura à igreja a
possibilidade de melhor exercer os direitos previstos em lei, além de evitar
eventuais abusos por parte do locador, como a retomada indevida do imóvel.
Convém ressaltar que no caso de imóvel alugado, a igreja não tem direito à
isenção do IPTU, pois o imóvel locado continua na propriedade do particular que
fez a locação.
A
supracitada Lei estabelece que nas locações de imóveis utilizados por organizações religiosas devidamente
registradas, o contrato somente poderá ser rescindido nas seguintes
hipóteses: I - por acordo entre as partes; II - em decorrência da prática de
infração legal ou contratual; III - por falta de pagamento do aluguel e demais
encargos; IV - para a realização de reparos urgentes determinados pelo Poder
Público, que não podem ser normalmente executados com a permanência do
locatário no imóvel, ou ainda, podendo ser executados, o locatário se recuse a
consentir na realização dos reparos; e, V – se o proprietário pedir o imóvel
para demolição, edificação, licenciada ou reforma que resulte no aumento mínimo
de cinqüenta por cento da área útil do imóvel. Desse modo, não será possível
desfazer a locação fora desses casos, razão pela qual é recomendável formalizar
sempre o respectivo contrato.
Noutro
giro, no âmbito dos atos de gestão eclesiástica propriamente dita, sugere-se a
utilização do Termo de Posse e
Responsabilidade Patrimonial. Pode ser utilizado, além dos registros em
Ata, para documentar a posse de dirigente de igreja ou de congregação. Nele
poderão constar os compromissos e as responsabilidades que o novo dirigente
está assumindo, como por exemplo, cumprir as normas previstas no Estatuto e no
Regimento Interno, bem como a obrigação de transmitir ao sucessor as
atribuições e o patrimônio da igreja, quando dispensado da função.
É
importante salientar, para a validade do Termo, que nele devem constar as
assinaturas do pastor presidente, do dirigente empossado e de pelo menos duas
testemunhas que tenham presenciado a lavratura do ato. Esse instrumento pode ser
de grande valia para assegurar direitos da igreja e exigir o correto desempenho
da função, além de ser útil nas situações em que o dirigente, depois de
regularmente dispensado, recusa-se a transmitir o cargo e o patrimônio.
Por
fim, ressalta-se que as organizações religiosas podem aprimorar a eficiência e
as garantias na sua gestão administrativa. Para tanto, precisam elaborar a
tempo e de forma adequada os diversos atos, termos e contratos jurídicos,
específicos para cada situação e atendendo aos objetivos da igreja. Dessa
maneira, estarão resguardando o regular funcionamento e o fiel cumprimento das
suas finalidades institucionais. Cuida-se, portanto, de administrar com zelo e
responsabilidade tudo que for dedicado ao Reino de Deus.
Nenhum comentário:
Postar um comentário