Defesa do Evangelho busca a prática sincera dos verdadeiros ensinos do SENHOR JESUS CRISTO. “...Sabendo que fui posto para defesa do evangelho. Mas que importa? Contanto que Cristo seja anunciado de toda a maneira, ou com fingimento ou em verdade, nisto me regozijo, e me regozijarei ainda” (Filipenses 1.17-18). Participe dessa Defesa! Deixe o seu comentário ao final do artigo ou escreva para o nosso email: adielteofilo7@gmail.com

sexta-feira, 31 de julho de 2015

PREGADORES IMPOSTORES

Por Mike Gilbart-Smith, Pastor da Twynholm Baptist Church (Fulham, Londres).

Impostores que Falham em Ver o Texto

1) O “Sermão Infundado”: o texto é mal entendido
Aqui o pregador diz coisas que parecem ser verdadeiras, mas em nenhum sentido vêm de uma correta interpretação da passagem. Ele é pouco cuidadoso com o conteúdo do texto (por exemplo, o sermão sobre a “resultar, motivar e prover” da tradução Nova Versão Internacional de 1 Tessalonicenses 1.3, sendo que nenhuma dessas palavras está presente no texto grego) ou com o contexto (por exemplo, o sermão sobre Davi e Golias, que pergunta “quem é seu Golias, e o que são as cinco pedras lisas que você precisa para estar preparado para usar contra ele?”).

Se um pregador não está extraindo profundamente a verdade da Palavra de Deus para determinar a mensagem de seus sermões, eles estão provavelmente sendo dirigidos pelas próprias ideias do pregador, não pelas ideias de Deus.

2) O “Sermão Trampolim”: o ponto do texto é ignorado
Intimamente relacionado ao sermão anterior é o sermão no qual o pregador fica intrigado com algo que é uma implicação secundária do texto, mas que não é o ponto principal. Imagine um sermão sobre as bodas de Caná, em João 2, que focaliza primariamente a permissão de cristãos beberem álcool e nada diz sobre a manifestação da glória de Cristo na Nova Aliança através do sinal de Jesus transformar a água em vinho.

Uma das grandes vantagens de pregações expositivas sequenciais é que o pregador é forçado a pregar em tópicos que ele preferiria evitar e a dar peso apropriado a tópicos que ele tenderia a superenfatizar. Um pregador de sermões “infundados” ou “trampolins” pode involuntariamente descartar ambas as vantagens, e assim a agenda de Deus é silenciada ou colocada de lado.

3) O “Sermão Doutrinário”: a riqueza do texto é ignorada
Deus deliberadamente tem falado conosco “de muitas maneiras” (Hebreus 1.1). Muitíssimos sermões ignoram o gênero literário de uma passagem, e pregam narrativa, poesia, epístola e apocalíptica do mesmo modo, como uma série de afirmações proposicionais. Embora todos os sermões devam comunicar verdades proposicionais, eles não devem se reduzir a elas. O contexto literário das passagens deveria significar que um sermão em Cântico dos Cânticos soa diferente de um em Efésios 5. A passagem pode ter o mesmo ponto central, mas é comunicada de uma maneira diferente. A diversidade da Escritura não deve ser nivelada na pregação, mas valorizada e comunicada de uma maneira sensível ao gênero literário. A narrativa deveria nos ajudar a ter empatia, a poesia deveria aumentar nossa resposta emocional e a apocalíptica e a profecia deveriam nos levar ao assombro.

4) O “Sermão Atalho”: o texto bíblico é apenas mencionado
Sendo o oposto do sermão exegético, esse tipo de pregação não mostra absolutamente nenhum “trabalho” exegético. Ainda que o Senhor tenha fixado a agenda pela Sua Palavra, somente o pregador está totalmente ciente desse fato. A congregação pode terminar dizendo: “que sermão maravilhoso”, ao invés de “que passagem da Escritura maravilhosa”.
Encorajaremos nossa congregação a ouvir a voz de Deus, e não somente a nossa, ao apontá-los frequentemente de volta ao texto bíblico: “veja o que Deus diz no verso cinco” mais do que “ouça cuidadosamente o que eu estou dizendo agora”.

5) O “Sermão Sem Cristo”: o sermão interrompido sem o Salvador
Jesus repreendeu os fariseus: “Examinais as Escrituras, porque julgais ter nelas a vida eterna, e são elas mesmas que testificam de mim. Contudo, não quereis vir a mim para terdes vida” (João 5.39,40). Quão triste é que, mesmo nós, que fomos a Jesus para ter vida, levemos toda uma congregação a estudar uma passagem da Escritura, e ainda assim nos recusemos a levá-la a ver o que essa Escritura diz sobre Cristo, tornando textos do Antigo Testamento em sermões moralistas, e até mesmo pregando sermões sem Cristo e sem evangelho dos próprios Evangelhos. Imagine o horror de um sermão na narrativa do Getsêmani que se concentre em como nós podemos lidar com o estresse em nossas vidas.

Se a Palavra de Deus é como uma enorme roda, o cubo da roda1 é Cristo e o eixo é o evangelho. Nós não teremos pregado fielmente nenhuma passagem da Escritura até que tenhamos encaixado os raios ao cubo, e comunicado o que a passagem diz sobre Cristo e como se relaciona com o evangelho. (1) Nota do tradutor: O cubo é a parte central da roda que liga toda a roda ao eixo e ao sistema de freios.

Impostores que Falham em Ver a Congregação

6) O “Sermão Exegético”: o texto fica não aplicado
Se o “sermão infundado” perde totalmente o texto, o “sermão exegético” perde totalmente a congregação. Algumas pregações que alegam ser expositivas são rejeitadas como chatas e irrelevantes... e corretamente! Algumas poderiam muito bem ser lidas em um comentário exegético. Tudo o que é dito é verdadeiro em relação à passagem, mas não é realmente pregação; é meramente uma palestra. Muito pode ser aprendido sobre o uso que Paulo faz do genitivo absoluto, mas pouco sobre o caráter de Deus ou a natureza do coração humano.
 
Não há aplicação a nada, exceto à mente da congregação. Certamente a verdadeira pregação expositiva, primeiro, informará a mente, mas também aquecerá o coração e compelirá a vontade. Uma dieta regular de pregação exegética fará as pessoas sentirem que somente pregações tópicas podem ser relevantes, e modelará leituras da Bíblia que presumem que nós podemos ler a Palavra de Deus fielmente e ainda permanecer não desafiados e inalterados.

7) O “Sermão Irrelevante”: o texto é aplicado a uma congregação diferente
Muitas pregações promovem orgulho na congregação ao jogar pedras por cima do muro no quintal do vizinho. Ou o ponto da passagem é aplicado somente aos descrentes, sugerindo que a Palavra não tem nada a dizer à igreja ou é aplicado a problemas que são raramente vistos na congregação para a qual se está pregando.

Assim, a congregação se torna inchada e, como os fariseus nas parábolas de Jesus, termina agradecida de que não é como os outros. A resposta não é arrependimento e fé, mas “Se aquela senhora ouvisse esse sermão!” ou “aquela outra igreja realmente deveria ter esse sermão pregado a eles!”. Esse tipo de pregação fará a congregação crescer em justiça própria, não em piedade.

8) O “Sermão Privado”: o texto é aplicado somente ao pregador
É fácil para o pregador pensar meramente sobre como a passagem se aplica a ele mesmo, e então pregar à congregação como se a congregação estivesse exatamente na mesma situação que o pregador. Para mim, é certamente mais fácil ver como uma passagem da Escritura se aplica a um homem branco britânico com seus quarenta anos, com uma esposa e seis crianças, que trabalha como pastor de uma pequena congregação na zona oeste de Londres. Isso pode ser maravilhoso para meus momentos de devocionais, mas de não muito útil para minha igreja, já que ninguém mais se encaixa nessa lista.

Quais são as implicações do texto para os adolescentes e as mulheres solteiras? Para a mulher com seus quarenta anos que deseja se casar e o imigrante? Para o desempregado e o visitante ateu ou muçulmano? Para a congregação como um todo e o motorista de ônibus, ou o que trabalha no escritório ou o estudante ou o que mora na casa da mãe?

O sermão privado pode levar a congregação a pensar que a Bíblia só é relevante ao cristão “profissional”, e que o único uso válido da sua vida seria, realmente, trabalhar em tempo integral para a igreja ou outra organização cristã. Esse sermão pode fazer a congregação idolatrar seu pastor e viver sua vida cristã vicariamente através dele. Esse sermão impede a congregação de enxergar como deve aplicar a Palavra a cada aspecto de sua vida e como comunicá-la àqueles cujas vidas são muito diferentes da sua própria.

9) O “Sermão Hipócrita”: o texto é aplicado a todos, menos ao pregador
O erro oposto do “sermão privado” é o sermão no qual o pregador é visto como aquele que ensina a Palavra, mas não é um modelo do que significa estar sob a Palavra. Há momentos quando um pregador precisa dizer “você” e não “nós”. Mas um pregador que sempre diz “você” e nunca “nós” não é um modelo de como ser apenas um subpastor que é, primeiro e antes de tudo, uma das ovelhas que deve, ela mesma, ouvir a voz do seu grande Pastor, conhecê-lo e segui-lo, confiando nele para sua vida eterna e segurança.

Um pregador que prega dessa forma pode cometer o erro oposto ao da congregação que vive vicariamente através do seu pastor: ele viverá vicariamente através da sua congregação. Ele assumirá que seu discipulado é inteiramente sobre seu ministério e, no fim das contas, terminará não andando como um discípulo sob a Palavra de Deus, mas somente como alguém que coloca outros sob a Palavra, acima da qual ele se assenta distante.

10) O “Sermão Desajustado”: o ponto da passagem é mal aplicado à congregação
Algumas vezes a distância hermenêutica entre a passagem original e a presente congregação pode ser mal entendida, de tal modo que a aplicação ao contexto original é, de modo errôneo, transferida diretamente ao contexto presente. Assim, se o pregador não tem uma correta teologia bíblica de culto, passagens sobre o templo do Antigo Testamento podem ser erroneamente aplicadas ao edifício da igreja do Novo Testamento, ao invés de serem cumpridas em Cristo e em seu povo. Os pregadores do evangelho da prosperidade podem reivindicar as promessas das bênçãos físicas dadas ao Israel fiel da Antiga Aliança e aplicá-las irrefletidamente ao povo de Deus da Nova Aliança.

Impostores que Falham em Ver o Senhor
Aulas de pregação frequentemente referem-se aos dois horizontes da pregação: o texto e a congregação. Mas o pregador cristão deve reconhecer que por trás de ambos encontra-se o Senhor que inspirou o texto e que está operando na congregação.

11) O “Sermão Sem Paixão”: o ponto da passagem é falado, não pregado
Seria possível haver um pregador que entendesse absolutamente a passagem e falasse sobre suas implicações à congregação presente de maneira capaz e até mesmo profunda. Porém, o pregador entrega o sermão como se ele estivesse lendo uma lista telefônica. Não há nenhum senso de que, quando o pregador entrega a Palavra de Deus, Deus mesmo está se comunicando com seu povo. Quando o pregador falha em reconhecer que é Deus mesmo, através de sua Palavra, que está pleiteando, encorajando, repreendendo, treinando, exortando, moldando e aprimorando seu povo, através da aplicação que o Espírito faz daquela Palavra, frequentemente não haverá paixão, reverência, solenidade, alegria visível, lágrimas de dor perceptíveis – apenas palavras. 

12) O “Sermão Sem Poder”: o ponto da passagem é pregado sem oração
Tanto tempo é dedicado ao estudo da passagem e à elaboração do sermão que pouco tempo é dedicado à oração pela compreensão correta ou aplicação apropriada.

O pregador que trabalha duro, mas ora pouco, confia mais em si mesmo e menos no Senhor. Essa é, talvez, uma das maiores tentações nas quais se pode cair, como um expositor, pois talvez só aqueles com maior discernimento na congregação estejam aptos a perceber uma exegese falsa ou uma aplicação inadequada, mas a diferença que a oração do pregador fez para o impacto do sermão será clara somente ao Senhor e no dia quando todas as coisas forem reveladas. Os horizontes do Senhor e da eternidade devem, em última análise, ser os mais importantes para o pregador; de fato, ele só deveria realmente se preocupar com os horizontes do texto e da congregação porque os horizontes do Senhor e da eternidade são invisíveis, ainda que de importância infinita.

Conclusão
A pregação expositiva é tão importante para a saúde da igreja porque ela permite que todo o conselho de Deus seja aplicado a toda a igreja de Deus. Que o Senhor prepare pregadores de sua Palavra de tal modo que sua voz seja ouvida e obedecida.

Notas:
Nota do editor: Este artigo é uma versão revisada expandida de um artigo que Mike escreveu vários anos atrás.
Tradução: André Aloísio Oliveira da Silva.
Revisão: Vinícius Musselman Pimentel.
Título original do artigo: Expositores impostores.


sexta-feira, 17 de julho de 2015

A IGREJA DENTRO DA LEI - Comércio Clandestino nos Templos

Por Adiel Teófilo.

As organizações religiosas são constituídas com a precípua finalidade de promover atividades de culto e de assistência eclesiástica aos seus fiéis. As suas ações e programas não podem possuir fins lucrativos, em razão da sua própria natureza jurídica, sob pena de incorrer em flagrante desvio de finalidade. No entanto, existem igrejas que desenvolvem atividades comerciais, paralelamente à programação religiosa. Essas igrejas estão fugindo completamente das finalidades institucionais para as quais foram criadas.

É bem verdade que algumas atividades são realizadas de forma eventual e sem qualquer estrutura que caracterize empreendimento comercial. Exemplo disso ocorre ao final de alguns cultos religiosos, quando é montada uma pequena mesa ou balcão improvisado, no qual são vendidos salgados, sucos, sorvetes e lanches em geral. Além disso, instalam-se também estandes para a venda de Bíblias, livros, CDs, DVDs e artigos evangélicos diversificados. A arrecadação com essas vendas eventuais tem se tornado em alternativa comum como fonte de receita para atender necessidades da própria igreja.

Esse tipo de venda improvisada, dentro da ótica de razoabilidade, pode até não se caracterizar como empreendimento comercial, considerando critérios de eventualidade, improvisação e volume inexpressivo de mercadoria comercializada. No entanto, a partir do momento em que essa prática deixa de ser eventual e se torna habitual, aumentando consideravelmente a quantidade de mercadoria comercializada, com o consequente aumento da receita, a igreja poderá incorrer numa espécie de comércio ambulante no templo.

Logicamente que essa modalidade não é praticada nas vias públicas, como se vê entre os ambulantes em nosso país. Entretanto, a comercialização é realizada no interior do templo ou nas suas dependências, o que equipara a igreja aos vendedores ambulantes, pois está praticando também trabalho informal, ainda que seja voluntária a mão-de-obra das pessoas envolvidas no negócio e o lucro revertido integralmente para a igreja.

Percebe-se que esse tipo de comércio é atividade que definitivamente não se amolda aos fins estatutários que identificam a organização religiosa. Não é de sua alçada incentivar e nem manter trabalho informal em suas dependências. E aqui talvez reside a maior dificuldade de certas igrejas, que é administrar dízimos e ofertas voluntárias para a sua subsistência, sem a necessidade de se recorrer sistematicamente a meios extra bíblicos para a sua mantença. É de se reconhecer também, por outro lado, que grande parte dos membros e congregados não aprendeu ainda a contribuir com a instituição religiosa que participa, muito embora usufrua dos benefícios espirituais e sociais que ela proporciona.   

Diante desse cenário, convém ressaltar que a Lei Complementar nº 128, de 19 de dezembro de 2008, criou a figura jurídica do microempreendedor individual (MEI), alterando as disposições da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006, que instituiu o Estatuto Nacional da Microempresa (ME) e da Empresa de Pequeno Porte (EPP). Assim dispõem o art. 18-A, e § 1o, dessa Lei Complementar:

Art. 18-A.  O Microempreendedor Individual - MEI poderá optar pelo recolhimento dos impostos e contribuições abrangidos pelo Simples Nacional em valores fixos mensais, independentemente da receita bruta por ele auferida no mês, na forma prevista neste artigo.

§ 1o Para os efeitos desta Lei Complementar, considera-se MEI o empresário individual a que se refere o art. 966, da Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), que tenha auferido receita bruta, no ano-calendário anterior, de até R$ 60.000,00 (sessenta mil reais), optante pelo Simples Nacional e que não esteja impedido de optar pela sistemática prevista neste artigo. 

A supracitada Lei criou facilidades de registro e condições especiais para que o trabalhador informal pudesse se regularizar, tornando-se desse modo empresário individual. A iniciativa foi no sentido de formalizar empreendimentos e negócios, afastando da informalidade inúmeras situações existentes no país, a exemplo de vendedores ambulantes e pequenos comércios que funcionam em residências. Logo, não é razoável que uma organização religiosa continue a fomentar o trabalho informal em suas dependências, contrariando dessa forma o espírito da lei que visa justamente combater a informalidade.

Noutro giro, há situações que ultrapassam as características de microempreendedor individual, conforme acima delineado. Existem igrejas que organizaram em suas dependências cantina, lanchonete ou restaurante, e/ou livraria, dentre outras atividades, que funcionam de forma permanente e com infraestrutura, equipamento e mobiliário de estabelecimento comercial. A mão-de-obra das pessoas que atuam nesses locais geralmente é voluntária e todo lucro revertido para a organização religiosa.

Nesses casos, podemos tomar como parâmetro de avaliação o limite financeiro fixado pela Lei Complementar em pauta. O § 1o do art. 18-A, acima transcrito, estabelece que para usufruir da condição de microempreendedor Individual (MEI), a receita bruta anual não pode ser superior a R$ 60.000,00, o que equivale a R$ 5.000,00 ao mês. Diante desse limite, salvo melhor juízo, podemos considerar que a igreja que realiza comércio nas suas dependências se enquadrada em uma das duas situações abaixo descritas:  

a) a igreja incorre na prática de comércio informal, quando a receita bruta com as vendas não ultrapassa R$ 5.000,00 ao mês. Pelo fato de atuar livremente no mercado sem a necessária regularização, estará usurpando da condição e benefícios concedidos a microempreendedor individual (MEI), como facilidades de registro e isenção de tributos; e,

b) quando a receita bruta com as vendas ultrapassa R$ 60.000,00 ao ano, a igreja está desenvolvendo irregularmente atividade de microempresário. Estará usurpando da condição e benefícios atribuídos a microempresa, em razão de atuar também livremente no mercado sem qualquer regularização junto aos órgãos competentes.

Nessa última situação, a organização religiosa estará praticando também uma espécie de concorrência desleal. Os comerciantes em geral, para exercerem a atividade como microempresário, além dos registros públicos e autorizações exigíveis, precisam pagar regularmente os impostos exigidos por lei. As igrejas, por sua vez, estarão desenvolvendo a mesma atividade, sem o recolhimento de qualquer tributo, gerando assim vantagem indevida para as igrejas em detrimento dos comerciantes locais.  

Acrescenta-se que a definição de microempresa consta do art. 3º, da sobredita Lei Complementar. Para ser considerada microempresa, além de estar devidamente inscrito no Registro Público de Empresas Mercantis ou no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, conforme o caso, o empresário, a empresa individual de responsabilidade limitada, a sociedade simples ou a sociedade empresária, deve auferir receita bruta igual ou inferior a R$ 360.000,00 ao ano. Caso a receita bruta anual ultrapasse esse valor, as formas de organização empresarial anteriormente citadas passam a ser consideradas como empresa de pequeno porte.

A par de todos esses argumentos, podemos apresentar as seguintes conclusões, a respeito da prática de comércio realizada nas dependências dos templos religiosos:

1ª) Venda improvisada: é o comércio eventual, totalmente improvisado, com pequeno volume de mercadoria comercializada e baixa arrecadação financeira;

2ª) Comércio informal equiparado à condição de microempreendedor individual: é o comércio habitual, com volume considerável de mercadoria vendida e receita bruta até o limite de R$ 60.000,00 ao ano, ou R$ 5.000,00 ao mês; e

3ª) Comércio irregular característico de microempresa: é a atividade econômica que aufere receita bruta anual superior a R$ 60.000,00, até o limite máximo de R$ 360.000,00 ao ano.   

Por fim, importante destacar que dentre as hipóteses acima descritas, as duas últimas denotam o completo desvio de finalidade da organização religiosa que se dedica ao comércio. Nessas hipóteses, caso seja necessária ou conveniente a comercialização de produtos, o ideal é dar oportunidade para o particular explorar a atividade comercial. Isso pode ser feito mediante a celebração de contrato que assegure retribuição proporcional pela utilização do espaço, além de cobrir as despesas com o consumo de água, energia elétrica e manutenção das instalações prediais. A igreja precisa funcionar dentro da legalidade, evitando a prática do comércio clandestino nos templos, servindo dessa forma de exemplo para a sociedade.   

sexta-feira, 10 de julho de 2015

A IGREJA DENTRO DA LEI - Isenção das Igrejas de Contribuir com a Seguridade Social

Por Adiel Teófilo.

Existia na legislação brasileira certa dúvida quanto a obrigatoriedade ou não das igrejas pagarem contribuição para a previdência social. Essa contribuição seria calculada sobre a renda eclesiástica propriamente dita, bem como sobre os valores pagos indiretamente com aluguel, plano de saúde, viagens, cursos de formação e outros benefícios custeados pela igreja para a subsistência dos ministros de confissão religiosa.

Essa matéria é disciplinada na Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, que dispõe sobre a organização da Seguridade Social e institui o seu Plano de Custeio. O art. 22 e seguintes dessa Lei tratam da contribuição destinada à Seguridade Social, a cargo da empresa. Entretanto, no § 13 do art. 22, estabeleceu a seguinte disposição a respeito das organizações religiosas:

§ 13. Não se considera como remuneração direta ou indireta, para os efeitos desta Lei, os valores despendidos pelas entidades religiosas e instituições de ensino vocacional com ministro de confissão religiosa, membros de instituto de vida consagrada, de congregação ou de ordem religiosa em face do seu mister religioso ou para sua subsistência desde que fornecidos em condições que independam da natureza e da quantidade do trabalho executado. (incluído pela Lei nº 10.170, de 2000).

Essa disposição acima transcrita foi alvo de divergência interpretativa. As organizações religiosas, por um lado, interpretavam que não estavam obrigadas a pagar contribuição para a Seguridade Social, pois as comissões e ajudas de custo que despendiam com os seus ministros religiosos não eram consideradas como remuneração para os efeitos da supracitada Lei. No entanto, por outro lado, a Receita Federal não comungava com esse entendimento, afirmando que as comissões não se destinavam à subsistência dos religiosos, razão pela qual passou a lavrar autos de infração contra as igrejas que não estavam recolhendo a referida contribuição.  

Diante desse cenário, foi promovida uma alteração legislativa visando firmar o entendimento esposado pelas igrejas. Com efeito, aproveitando-se da Medida Provisória nº 668, de 30 de janeiro de 2015, encaminhada pelo Poder Executivo com a finalidade de aumentar os impostos sobre produtos importados, a Câmara dos Deputados inseriu no texto uma regra que foi aprovada, garantindo às igrejas a isenção do pagamento da contribuição para a Seguridade Social sobre os valores pagos aos ministros de confissão religiosa.

Desse modo, foi sancionada a Lei nº 13.137, de 19 de junho de 2015. O art. 7º dessa nova Lei acrescentou o § 14 ao art. 22, da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, que dispõe sobre a organização da Seguridade Social. Eis o seu interior teor:    

§ 14.  Para efeito de interpretação do § 13 deste artigo:

I - os critérios informadores dos valores despendidos pelas entidades religiosas e instituições de ensino vocacional aos ministros de confissão religiosa, membros de vida consagrada, de congregação ou de ordem religiosa não são taxativos e sim exemplificativos;

II - os valores despendidos, ainda que pagos de forma e montante diferenciados, em pecúnia ou a título de ajuda de custo de moradia, transporte, formação educacional, vinculados exclusivamente à atividade religiosa não configuram remuneração direta ou indireta.” (NR)

Com se percebe, esse § 14 foi acrescentado com a finalidade de esclarecer a interpretação do § 13 do mesmo art. 22, da Lei que organiza a Seguridade Social. Cuida-se nesse caso do que se chama em Direito de interpretação autêntica, porquanto a norma editada tem a função meramente interpretativa, surtindo efeitos retroativos, atingindo fatos passados, por ter se limitado a explicar o sentido da norma anteriormente editada. Diante disso, as autuações fiscais promovidas pela Receita Federal contra as igrejas devem ser anuladas, tornando-se inexigível o pagamento da contribuição para a Seguridade Social.

De fato, a par dessa norma interpretativa, conclui-se que fica garantida a isenção das igrejas quanto ao pagamento da referida contribuição. O inciso I do § 14 assegura a mais ampla liberdade para a igreja estabelecer o valor da renda eclesiástica, pois os critérios mencionados na Lei para compor essa renda são apenas exemplificativos, ou seja, as organizações religiosas podem usar quaisquer critérios para fixar o valor da prebenda e demais verbas.     

Além disso, para os efeitos da Lei em pauta, fica afastada a natureza remuneratória de quaisquer valores recebidos pelos religiosos. O inciso II do § 14 esclarece que os valores pagos pelas igrejas para a subsistência dos seus ministros de confissão religiosa, ainda que de forma e montante diferenciados, seja em dinheiro ou através das ajudas de custo diversas, desde que vinculadas exclusivamente à atividade religiosa, não configuram remuneração direta e nem indireta. Enfim, as igrejas estão livres de pagar a contribuição para a Seguridade Social sobre a renda eclesiástica destinadas aos seus ministros religiosos.

Cumpre ressaltar, por derradeiro, que essa isenção se refere exclusivamente às organizações religiosas. Não se trata de isenção da contribuição previdenciária devida pelos ministros de confissão religiosa. A Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, que dispõe sobre a organização da Seguridade Social, relaciona no art.12, inciso V, alínea “c”, as pessoas físicas que devem contribuir como segurado obrigatório da Previdência Social, enquadrando os ministros de confissão religiosa na condição de contribuinte individual. Devem, portanto, efetuar o pagamento da contribuição previdenciária.