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domingo, 25 de junho de 2017

A IGREJA DENTRO DA LEI - Estado laico X Liberdade religiosa nas repartições públicas

Por Adiel Teófilo.


O princípio do Estado laico tem sido objeto de várias controvérsias dentro de alguns órgãos públicos em nosso país, apesar da clareza do direito fundamental de liberdade religiosa, assegurado pela Constituição Federal.

Essas controvérsias são decorrentes basicamente dos equívocos de interpretação e aplicação do princípio da laicidade. Esses equívocos interpretativos concorrem para fomentar uma espécie de aversão a qualquer atividade de caráter religioso no interior de repartições públicas, escolas, hospitais, como se tal princípio tivesse por finalidade proibir toda e qualquer manifestação religiosa nesses locais.

Essa aversão proibitiva de manifestações religiosas no interior de entidades públicas não encontra respaldo na legislação. Além disso, afronta o princípio da liberdade de exercício dos cultos, previsto na Constituição Federal, no art. 5º, inc. VI: é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;.

Essa garantia de liberdade religiosa é uma importante conquista dos cidadãos brasileiros, que pode ser exercida em perfeita harmonia com o princípio do Estado laico. Não há conflito entre esses princípios, quando aplicados nos moldes previstos na legislação. A história e a evolução Constitucional Brasileira nos ajudam a compreender como é possível harmonizar a prática de culto com a laicidade do Estado. 

O direito de liberdade religiosa somente foi inserido no ordenamento jurídico pátrio com o advento da Constituição Republicana. Trata-se da Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, promulgada em 24 de fevereiro de 1891, cujo art. 72, § 3º, assim prescrevia, ipsis litteris: Todos os individuos e confissões religiosas podem exercer publica e livremente o seu culto, associando-se para esse fim e adquirindo bens, observadas as disposições do direito commum.

Ressalta-se que a Constituição anterior não garantia a liberdade de culto. Tão somente permitia a liberdade de crença, desde que não externassem publicamente as manifestações religiosas. Isso porque o Império tinha como religião oficial a católica apostólica romana. A Constituição Política do Império do Brazil, outorgada em 25 de março de 1824, estabelecia no art. 5º, in verbis: A Religião Catholica Apostolica Romana continuará a ser a Religião do Imperio. Todas as outras Religiões serão permitidas com seu culto domestico, ou particular em casas para isso destinadas, sem fórma alguma exterior do Templo.

A Constituição Federal em vigor, promulgada em 05 de outubro de 1988, seguindo a mesma linha das Constituições posteriores à Republicana, manteve o princípio da liberdade religiosa. Instituiu também o princípio do Estado laico, mediante a proibição imposta à União, Estados, Distrito Federal e Municípios, de oficializar qualquer igreja ou culto religioso. Desse modo, esses entes públicos não podem apoiar um segmento religioso e nem discriminar nenhuma religião. Devem se manter em posição absolutamente neutra, completamente imparcial em relação aos cultos religiosos existentes no país. 

Essa imparcialidade imposta ao Estado não implica dizer que estão proibidas as manifestações religiosas em espaços públicos. Não significa também que o Estado, por meio dos seus agentes e servidores, deve impedir as práticas públicas de culto nos interior dos órgãos públicos. Ao contrário disso, o Estado não pode causar nenhum embaraço e nem dificultar a atividade religiosa exercida livre e espontaneamente por seus cidadãos, desde que respeitada a liberdade de convicção e crença de cada pessoa.

Essas limitações são impostas aos entes públicos pela Constituição Federal, que dispõe no art. 19 dessa forma: É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público;. Esses são os preceitos que traduzem o real sentido do princípio de Estado laico.

Acerca do referido princípio, Pedro Lenza, na obra Direito Constitucional Esquematizado, 17ª edição, Editora Saraiva, assim preleciona: existe separação entre Estado e Igreja, sendo o Brasil um país leigo, laico, ou não confessional, não existindo, portanto, qualquer religião oficial da República Federativa do Brasil. E ao discorrer acerca da liberdade religiosa, ressalta os seguintes aspectos: Dentro de uma ideia de bom-senso, prudência e razoabilidade, a Constituição assegura o direito a todos de aderir a qualquer crença religiosa, ou recusá-las, ou, ainda, de seguir qualquer corrente filosófica, ou de ser ateu e exprimir o agnosticismo, garantindo-se a liberdade de descrença ou a mudança da escolha já feita.

Diante disso, a correta interpretação do princípio de Estado laico conduz necessariamente ao entendimento de que tal princípio não tem o condão de suprimir a liberdade religiosa dos cidadãos. Muito pelo contrário, como visto acima, a laicidade estatal impõe uma vedação não aos indivíduos, mas ao próprio Estado, proibindo-o de assumir uma bandeira religiosa e de impedir o livre exercício das expressões religiosas por parte daqueles que possuem uma crença.

Decorre ainda desse princípio, o fato de que o Estado, por meio dos seus agentes e servidores, deve permitir que as manifestações de culto ocorram em ambientes públicos, tais como escolas, hospitais, presídios, dentre outros. Essa possibilidade de culto fica claramente evidenciada pela Constituição Federal que garante o acesso de religiosos a locais restritos, para a prestação do serviço de assistência religiosa, denominado capelania, conforme art. 5º, inc. VII: é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva;.

O supracitado dispositivo Constitucional foi regulamentado pela Lei nº 9.982, de 14 de julho de 2000, cujo art. 1º dispõe: Aos religiosos de todas as confissões assegura-se o acesso aos hospitais da rede pública ou privada, bem como aos estabelecimentos prisionais civis ou militares, para dar atendimento religioso aos internados, desde que em comum acordo com estes, ou com seus familiares no caso de doentes que já não mais estejam no gozo de suas faculdades mentais. Nota-se que esse preceito legal autoriza expressamente a prática religiosa em hospitais da rede pública, bem como em estabelecimentos prisionais civis ou militares, unidades organizadas e mantidas pelo Estado, desde que observadas as peculiaridades desses ambientes.

Acrescenta-se como mais uma evidência de que o Estado deve permitir a prática de culto em repartições públicas, o fato de que algumas instituições criaram quadro próprio de capelania. Os religiosos que compõem esses quadros são denominados capelães e prestam assistência religiosa prioritariamente aos integrantes dessas instituições públicas. É o caso da Polícia Militar e Corpo de Bombeiro Militar dos Estados da Federação, bem como das Forças Armadas.

Cita-se a título de exemplo a Lei nº 6.923, de 29 de junho de 1981, que organizou o Serviço de Assistência Religiosa nas Forças Armadas. O art. 2º desse diploma legal preconiza: O Serviço de Assistência Religiosa tem por finalidade prestar assistência religiosa e espiritual aos militares, aos civis das organizações militares e às suas famílias, bem como atender a encargos relacionados com as atividades de educação moral realizadas nas Forças Armadas.

Constata-se, portanto, que a Constituição Federal e as Leis Federais acima referidas autorizam de modo expresso a atividade religiosa no interior de hospitais públicos, presídios civis e militares do Estado, bem como a realização do serviço de capelania nas instituições militares dos Estados da Federação e nas Forças Armadas. Logo, não há como impedir a manifestação religiosa em escolas e demais repartições públicas não referidas expressamente. Isso porque deve existir igualdade de direitos e de tratamento entre todos os cidadãos brasileiros, como forma de promover o bem estar de todos, sem preconceitos e sem quaisquer outras formas de discriminação.

Diante do exposto, conclui-se que há perfeita harmonia entre o princípio da liberdade religiosa e o princípio do Estado laico, não existindo qualquer conflito entre ambos. A laicidade do Estado não impõe vedações aos indivíduos, mas ao próprio Estado, que fica impedido de oficializar culto religioso ou igreja, bem como de provocar embaraços ao livre exercício das manifestações religiosas. 

Ademais, Estado laico não significa afirmar que estão proibidas as práticas de culto no interior de repartições governamentais. Isso porque a legislação autoriza a prestação de assistência religiosa (capelania) em hospitais públicos, presídios civis e militares, Polícias e Bombeiros Militares dos Estados da Federação e nas Forças Armadas. Enfim, essa liberdade de culto se estende às demais entidades públicas, como escolas e repartições não referidas expressamente em lei, por força do princípio da igualdade de direitos entre os cidadãos brasileiros. 

domingo, 12 de março de 2017

UM ENGANO CHAMADO "TEOLOGIA INCLUSIVA" OU "TEOLOGIA GAY"

 Por Rev. Augustus Nicodemus Lopes.

O padrão de Deus para o exercício da sexualidade humana é o relacionamento entre um homem e uma mulher no ambiente do casamento. Nesta área, a Bíblia só deixa duas opções para os cristãos: casamento heterossexual e monogâmico ou uma vida celibatária. À luz das Escrituras, relações sexuais entre pessoas do mesmo sexo são vistas não como opção ou alternativa, mas sim como abominação, pecado e erro, sendo tratada como prática contrária à natureza. Contudo, neste tempo em que vivemos, cresce na sociedade em geral, e em setores religiosos, uma valorização da homossexualidade como comportamento não apenas aceitável, mas supostamente compatível com a vida cristã. Diferentes abordagens teológicas têm sido propostas no sentido de se admitir que homossexuais masculinos e femininos possam ser aceitos como parte da Igreja e expressar livremente sua homoafetividade no ambiente cristão.

Existem muitas passagens na Bíblia que se referem ao relacionamento sexual padrão, normal, aceitável e ordenado por Deus, que é o casamento monogâmico heterossexual. Desde o Gênesis, passando pela lei e pela trajetória do povo hebreu, até os evangelhos e as epístolas do Novo Testamento, a tradição bíblica aponta no sentido de que Deus criou homem e mulher com papéis sexuais definidos e complementares do ponto de vista moral, psicológico e físico. Assim, é evidente que não é possível justificar o relacionamento homossexual a partir das Escrituras, e muito menos dar à Bíblia qualquer significado que minimize ou neutralize sua caracterização como ato pecaminoso. Em nenhum momento, a Palavra de Deus justifica ou legitima um estilo homossexual de vida, como os defensores da chamada “teologia inclusiva” têm tentado fazer. Seus argumentos têm pouca ou nenhuma sustentação exegética, teológica ou hermenêutica.

A “teologia inclusiva” é uma abordagem segundo a qual, se Deus é amor, aprovaria todas as relações humanas, sejam quais forem, desde que haja este sentimento. Essa linha de pensamento tem propiciado o surgimento de igrejas onde homossexuais, nesta condição, são admitidos como membros e a eles é ensinado que o comportamento gay não é fator impeditivo à vida cristã e à salvação. Assim, desde que haja amor genuíno entre dois homens ou duas mulheres, isso validaria seu comportamento, à luz das Escrituras. A falácia desse pensamento é que a mesma Bíblia que nos ensina que Deus é amor igualmente diz que ele é santo e que sua vontade quanto à sexualidade humana é que ela seja expressa dentro do casamento heterossexual, sendo proibidas as relações homossexuais.

Em segundo lugar, a “teologia inclusiva” defende que as condenações encontradas no Antigo Testamento, especialmente no livro de Levítico, se referem somente às relações sexuais praticadas em conexão com os cultos idolátricos e pagãos, como era o caso dos praticados pelas nações ao redor de Israel. Além disso, tais proibições se encontram ao lado de outras regras contra comer sangue ou carne de porco, que já seriam ultrapassadas e, portanto, sem validade para os cristãos. Defendem ainda que a prova de que as proibições das práticas homossexuais eram culturais e cerimoniais é que elas eram punidas com a morte – coisa que não se admite a partir da época do Novo Testamento. 

É fato que as relações homossexuais aconteciam inclusive – mas não exclusivamente – nos cultos pagãos dos cananeus. Contudo, fica evidente que a condenação da prática homossexual transcende os limites culturais e cerimoniais, pois é repetida claramente no Novo Testamento. Ela faz parte da lei moral de Deus, válida em todas as épocas e para todas as culturas. A morte de Cristo aboliu as leis cerimoniais, como a proibição de se comer determinados alimentos, mas não a lei moral, onde encontramos a vontade eterna do Criador para a sexualidade humana. Quando ao apedrejamento, basta dizer que outros pecados punidos com a morte no Antigo Testamento continuam sendo tratados como pecado no Novo, mesmo que a condenação capital para eles tenha sido abolida – como, por exemplo, o adultério e a desobediência contumaz aos pais.

PECADO E DESTRUIÇÃO
Os teólogos inclusivos gostam de dizer que Jesus Cristo nunca falou contra o homossexualismo. Em compensação, falou bastante contra a hipocrisia, o adultério, a incredulidade, a avareza e outros pecados tolerados pelos cristãos. Este é o terceiro ponto: sabe-se, todavia, que a razão pela qual Jesus não falou sobre homossexualidade é que ela não representava um problema na sociedade judaica de sua época, que já tinha como padrão o comportamento heterossexual. Não podemos dizer que não havia judeus que eram homossexuais na época de Jesus, mas é seguro afirmar que não assumiam publicamente esta conduta. Portanto, o homossexualismo não era uma realidade social na Palestina na época de Jesus. Todavia, quando a Igreja entrou em contato com o mundo gentílico – sobretudo as culturas grega e romana, onde as práticas homossexuais eram toleradas, embora não totalmente aceitas –, os autores bíblicos, como Paulo, incluíram as mesmas nas listas de pecados contra Deus. Para os cristãos, Paulo e demais autores bíblicos escreveram debaixo da inspiração do Espírito Santo enviado por Jesus Cristo. Portanto, suas palavras são igualmente determinantes para a conduta da Igreja nos dias de hoje.


O quarto ponto equivocado da abordagem que tenta fazer do comportamento gay algo normal e aceitável no âmbito do Cristianismo é a suposição de que o pecado de Sodoma e Gomorra não foi o homossexualismo, mas a falta de hospitalidade para com os hóspedes de Ló. A base dos teólogos inclusivos para esta afirmação é que no original hebraico se diz que os homens de Sodoma queriam “conhecer” os hóspedes de Ló (Gênesis 19.5) e não abusar sexualmente deles, como é traduzido em várias versões, como na Almeida atualizada. Outras versões como a Nova versão internacional e a Nova tradução na linguagem de hoje entendem que conhecer ali é conhecer sexualmente e dizem que os concidadãos de Ló queriam “ter relações” com os visitantes, enquanto a SBP é ainda mais clara: “Queremos dormir com eles”. Usando-se a regra de interpretação simples de analisar palavras em seus contextos, percebe-se que o termo hebraico usado para dizer que os homens de Sodoma queriam “conhecer” os hóspedes de Ló (yadah) é o mesmo termo que Ló usa para dizer que suas filhas, que ele oferecia como alternativa à tara daqueles homens, eram virgens: “Elas nunca conheceram (yadah) homem”, diz o versículo 8. Assim, fica evidente que “conhecer”, no contexto da passagem de Gênesis, significa ter relações sexuais. Foi esta a interpretação de Filo, autor judeu do século 1º, em sua obra sobre a vida de Abraão: segundo ele, "os homens de Sodoma se acostumaram gradativamente a ser tratados como mulheres."

Ainda sobre o pecado cometido naquelas cidades bíblicas, que acabaria acarretando sua destruição, a “teologia inclusiva” defende que o profeta Ezequiel claramente diz que o erro daquela gente foi a soberba e a falta de amparo ao pobre e ao necessitado (Ez 16.49). Contudo, muito antes de Ezequiel, o “sodomita” era colocado ao lado da prostituta na lei de Moisés: o rendimento de ambos, fruto de sua imoralidade sexual, não deveria ser recebido como oferta a Deus, conforme Deuteronômio 23.18. Além do mais, quando lemos a declaração do profeta em contexto, percebemos que a soberba e a falta de caridade era apenas um entre os muitos pecados dos sodomitas. Ezequiel menciona as “abominações” dos sodomitas, as quais foram a causa final da sua destruição: “Eis que esta foi a iniquidade de Sodoma, tua irmã: soberba, fartura de pão e próspera tranquilidade teve ela e suas filhas; mas nunca amparou o pobre e o necessitado. Foram arrogantes e fizeram abominações diante de mim; pelo que, em vendo isto, as removi dali” (Ez 16.49-50). Da mesma forma, Pedro, em sua segunda epístolas, refere-se às práticas pecaminosas dos moradores de Sodoma e Gomorra tratando-as como “procedimento libertino”.

Um quinto argumento é que haveria alguns casos de amor homossexual na Bíblia, a começar pelo rei Davi, para quem o amor de seu amigo Jônatas era excepcional, “ultrapassando o das mulheres” (II Samuel 1.26). Contudo, qualquer leitor da Bíblia sabe que o maior problema pessoal de Davi era a falta de domínio próprio quanto à sua atração por mulheres. Foi isso que o levou a casar com várias delas e, finalmente, a adulterar com Bate-Seba, a mulher de Urias. Seu amor por Jônatas era aquela amizade intensa que pode existir entre duas pessoas do mesmo sexo e sem qualquer conotação erótica. Alguns defensores da “teologia inclusiva” chegam a categorizar o relacionamento entre Jesus e João como homoafetivo, pois este, sendo o discípulo amado do Filho de Deus, numa ocasião reclinou a sua cabeça no peito do Mestre (João 13.25). Acontece que tal atitude, na cultura oriental, era uma demonstração de amizade varonil – contudo, acaba sendo interpretada como suposta evidência de um relacionamento homoafetivo. Quem pensa assim não consegue enxergar amizade pura e simples entre pessoas do mesmo sexo sem lhe atribuir uma conotação sexual.

“TORPEZA”

Há uma sexta tentativa de reinterpretar passagens bíblicas com objetivo de legitimar a homossexualidade. Os propagadores da “teologia gay” dizem que, no texto de Romanos 1.24-27, o apóstolo Paulo estaria apenas repetindo a proibição de Levítico à prática homossexual na forma da prostituição cultual, tanto de homens como de mulheres – proibição esta que não se aplicaria fora do contexto do culto idolátrico e pagão. Todavia, basta que se leia a passagem para ficar claro o que Paulo estava condenando. O apóstolo quis dizer exatamente o que o texto diz: que homens e mulheres mudaram o modo natural de suas relações íntimas por outro, contrário à natureza, e que se inflamaram mutuamente em sua sensualidade – homens com homens e mulheres com mulheres –, “cometendo torpeza” e “recebendo a merecida punição por seus erros”. E ao se referir ao lesbianismo como pecado, Paulo deixa claro que não está tratando apenas da pederastia, como alguns alegam, visto que a mesma só pode acontecer entre homens, mas a todas as relações homossexuais, quer entre homens ou mulheres.

É alegado também que, em I Coríntios 6.9, os citados efeminados e sodomitas não seriam homossexuais, mas pessoas de caráter moral fraco (malakoi, pessoa “macia” ou “suave”) e que praticam a imoralidade em geral (arsenokoites, palavra que teria sido inventada por Paulo). Todavia, se este é o sentido, o que significa as referências a impuros e adúlteros, que aparecem na mesma lista? Por que o apóstolo repetiria estes conceitos? Na verdade, efeminado se refere ao que toma a posição passiva no ato homossexual – este é o sentido que a palavra tem na literatura grega da época, em autores como Homero, Filo e Josefo – e sodomita é a referência ao homem que deseja ter coito com outro homem.

Há ainda uma sétima justificativa apresentada por aqueles que acham que a homossexualidade é compatível com a fé cristã. Segundo eles, muitas igrejas cristãs históricas, hoje, já aceitam a prática homossexual como normal – tanto que homossexuais praticantes, homens e mulheres, têm sido aceitos não somente como membros mas também como pastores e pastoras. Essas igrejas, igualmente, defendem e aceitam a união civil e o casamento entre pessoa do mesmo sexo. É o caso, por exemplo, da Igreja Presbiteriana dos Estados Unidos – que nada tem a ver com a Igreja Presbiteriana do Brasil –, da Igreja Episcopal no Canadá e de igrejas em nações européias como Suécia, Noruega e Dinamarca, entre outras confissões. Na maioria dos casos, a aceitação da homossexualidade provocou divisões nestas igrejas, e é preciso observar, também, que só aconteceu depois de um longo processo de rejeição da inspiração, infalibilidade e autoridade da Bíblia. Via de regra, essas denominações adotaram o método histórico-crítico – que, por definição, admite que as Sagradas Escrituras são condicionadas culturalmente e que refletem os erros e os preconceitos da época de seus autores. Desta forma, a aceitação da prática homossexual foi apenas um passo lógico. Outros ainda virão. Todavia, cristãos que recebem a Bíblia como a infalível e inerrante Palavra de Deus não podem aceitar a prática homossexual, a não ser como uma daquelas relações sexuais consideradas como pecaminosas pelo Senhor, como o adultério, a prostituição e a fornicação.

Contudo, é um erro pensar que a Bíblia encara a prática homossexual como sendo o pecado mais grave de todos. Na verdade, existe um pecado para o qual não há perdão, mas com certeza não se trata da prática homossexual: é a blasfêmia contra o Espírito Santo, que consiste em atribuir a Satanás o poder pelo qual Jesus Cristo realizou os seus milagres e prodígios aqui neste mundo, mencionado em Marcos 3.22-30. Consequentemente, não está correto usar a Bíblia como base para tratar homossexuais como sendo os piores pecadores dentre todos, que estariam além da possibilidade de salvação e que, portanto, seriam merecedores de ódio e desprezo. É lamentável e triste que isso tenha acontecido no passado e esteja se repetindo no presente. A mensagem da Bíblia é esta: “Todos pecaram e carecem da glória de Deus”, conforme Romanos 3.23. Todos nós precisamos nos arrepender de nossos pecados e nos submetermos a Jesus Cristo, o Salvador, pela fé, para recebermos o perdão e a vida eterna.

Lembremos ainda que os autores bíblicos sempre tratam da prática homossexual juntamente com outros pecados. O 20º capítulo de Levítico proíbe não somente as relações entre pessoas do mesmo sexo, como também o adultério, o incesto e a bestialidade. Os sodomitas e efeminados aparecem ao lado dos adúlteros, impuros, ladrões, avarentos e maldizentes, quando o apóstolo Paulo lista aqueles que não herdarão o Reino de Deus (I Coríntios 6.9-10). Porém, da mesma forma que havia nas igrejas cristãs adúlteros e prostitutas que haviam se arrependido e mudado de vida, mediante a fé em Jesus Cristo, havia também efeminados e sodomitas na lista daqueles que foram perdoados e transformados.


COMPAIXÃO
É fundamental, aqui, fazer uma importante distinção. O que a Bíblia condena é a prática homossexual, e não a tentação a esta prática. Não é pecado ser tentado ao homossexualismo, da mesma forma que não é pecado ser tentado ao adultério ou ao roubo, desde que se resista. As pessoas que sentem atração por outras do mesmo sexo devem lembrar que tal desejo é resultado da desordem moral que entrou na humanidade com a queda de Adão e que, em Cristo Jesus, o segundo Adão, podem receber graça e poder para resistir e vencer, sendo justificados diante de Deus.

Existem várias causas identificadas comumente para a atração por pessoas do mesmo sexo, como o abuso sexual sofrido na infância. Muitos gays provêm de famílias disfuncionais ou tiveram experiências negativas com pessoas do sexo oposto.  Há aqueles, também, que agem deliberadamente por promiscuidade e têm desejo de chocar os outros. Um outro fator a se levar em conta são as tendências genéticas à homossexualidade, cuja existência não está comprovada até agora e tem sido objeto de intensa polêmica. Todavia, do ponto de vista bíblico, o homossexualismo é o resultado do abandono da glória de Deus, da idolatria e da incredulidade por parte da raça humana, conforme Romanos 1.18-32. Portanto, não é possível para quem crê na Bíblia justificar as práticas homossexuais sob a alegação de compulsão incontrolável e inevitável, muito embora os que sofrem com esse tipo de impulso devam ser objeto de compaixão e ajuda da Igreja cristã.

É preciso também repudiar toda manifestação de ódio contra homossexuais, da mesma forma com que o fazemos em relação a qualquer pessoa. Isso jamais nos deveria impedir, todavia, de declarar com sinceridade e respeito nossa convicção bíblica de que a prática homossexual é pecaminosa e que não podemos concordar com ela, nem com leis que a legitimam. Diante da existência de dispositivos legais que permitem que uma pessoa deixe ou transfira seus bens a quem ele queira, ainda em vida, não há necessidade de leis legitimando a união civil de pessoas de mesmo sexo – basta a simples manifestação de vontade, registrada em cartório civil, na forma de testamento ou acordo entre as partes envolvidas. O reconhecimento dos direitos da união homoafetiva valida a prática homossexual e abre a porta para o reconhecimento de um novo conceito de família. No Brasil, o reconhecimento da união civil de pessoas do mesmo sexo para fins de herança e outros benefícios aconteceu ao arrepio do que diz a Constituição: “Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento” (Art. 226, § 3º).

Cristãos que recebem a Bíblia como a palavra de Deus não podem ser a favor do casamento entre pessoas do mesmo sexo, uma vez que seria a validação daquilo que as Escrituras, claramente, tratam como pecado. O casamento está no âmbito da autoridade do Estado e os cristãos são orientados pela Palavra de Deus a se submeter às autoridades constituídas; contudo, a mesma Bíblia nos ensina que nossa consciência está submissa, em última instância, à lei de Deus e não às leis humanas – “Importa antes obedecer a Deus que os homens” (Atos 5.29). Se o Estado legitimar aquilo que Deus considera ilegítimo, e vier a obrigar os cristãos a irem contra a sua consciência, eles devem estar prontos a viver, de maneira respeitosa e pacífica em oposição sincera e honesta, qualquer que seja o preço a ser pago.

[Artigo publicado na revista Cristianismo Hoje] 

terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

A IGREJA DENTRO DA LEI - Assistência Religiosa ou Capelania

Por Adiel Teófilo. 

A República Federativa do Brasil tem como principal fundamento o princípio do Estado Democrático de Direito, conforme preceitua o art. 1º da Constituição Federal de 1988. A partir desse princípio de construção da ordem jurídico-constitucional, foram estabelecidas diversas garantias, visando proteger as liberdades e os direitos dos cidadãos na convivência em sociedade.

Dentre essas garantias constitucionais, destaca-se a proteção do Estado em favor da liberdade de consciência e de crença religiosa. Implica dizer que todas as pessoas, indistintamente, podem desenvolver no território nacional, com total liberdade, a prática de qualquer religião ou culto confessional, conforme art. 5º, inc. VI, da Constituição Federal, que assim dispõe: “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;”.

Outra importante garantia é a prestação de assistência religiosa, denominado também de serviço de capelania. Essa atividade encontra amparo no art. 5º, inc. VII, da Constituição Federal, que assim preconiza: “é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva;”. Esse preceito constitucional assegura que o serviço de assistência religiosa pode ser prestado em favor das pessoas que se encontram internadas em hospitais, abrigos, cadeias, presídios e demais entidades semelhantes, sejam elas de natureza civil ou militar.

Importante destacar que a assistência religiosa deve ser exercida “nos termos da lei”, conforme dispõe o inciso acima transcrito. Dessa forma, na prestação do serviço religioso, devem ser acatadas as disposições contidas em lei que regulamenta a atividade em pauta. Nesse sentido foi editada a Lei nº 9.982, de 14 de julho de 2000. Essa Lei Federal dispõe de modo geral sobre a prestação de assistência religiosa nas entidades hospitalares, públicas e privadas, bem como nos estabelecimentos prisionais civis e militares. Eis a sua íntegra:  

Art. 1o Aos religiosos de todas as confissões assegura-se o acesso aos hospitais da rede pública ou privada, bem como aos estabelecimentos prisionais civis ou militares, para dar atendimento religioso aos internados, desde que em comum acordo com estes, ou com seus familiares no caso de doentes que já não mais estejam no gozo de suas faculdades mentais.
Parágrafo único. (VETADO)
Art. 2o Os religiosos chamados a prestar assistência nas entidades definidas no art. 1o deverão, em suas atividades, acatar as determinações legais e normas internas de cada instituição hospitalar ou penal, a fim de não pôr em risco as condições do paciente ou a segurança do ambiente hospitalar ou prisional.

Esse diploma legal está em vigor e tem eficácia em todo o território nacional. Estabelece dois importantes requisitos, os quais devem ser observados por todas as confissões e denominações religiosas que pretendem realizar o serviço de capelania, a saber:

            1º. Requisito do consentimento: as pessoas que se encontram internadas precisam concordar em receber o atendimento religioso. Quando essas pessoas não puderem exprimir sua vontade, em razão de enfermidade ou incapacidade mental, os familiares podem autorizar a atividade em favor do enfermo ou incapaz;

            2º. Requisito do cumprimento das normas: os religiosos devem acatar as determinações legais que regulamentam a assistência religiosa, bem como as normas internas da unidade hospitalar ou do estabelecimento prisional, a fim de não colocar em risco a saúde do paciente ou a segurança do ambiente onde prestará o serviço de capelania.  

Convém ressaltar ainda que o art. 2º, da Lei Federal transcrita acima, estabelece a obrigatoriedade de “acatar as determinações legais...”. Isso se deve ao fato de que cada Unidade da Federação pode legislar sobre a matéria, com amparo no art. 25, § 1º, da Constituição Federal, editando lei estadual, bem como decreto, regulamentando a atividade no âmbito do respectivo Estado. No Distrito Federal, por exemplo, editou-se a Lei nº 3.216, de 05 de novembro de 2003, com o seguinte teor:

Art. 1° A presente lei regulamenta a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva no âmbito do Distrito Federal.
Art. 2° E garantida a livre prática de culto para todas as crenças religiosas.
Parágrafo único. A liberdade de religião fica condicionada às limitações impostas pela presente Lei e seu regulamento em favor do interesse prevalecente da coletividade.
Art. 3° A assistência religiosa somente poderá ser ministrada se houver opção dos interessados nesse sentido.
Art. 4º O ingresso na assistência religiosa far-se-á por indicação de entidade religiosa competente, de candidatos que se enquadrem nas seguintes condições:
I – ser sacerdote, pastor, ministro religioso ordenado ou voluntário leigo;
II – ter consentimento expresso da igreja ou da denominação a que pertença;
III – possuir idoneidade moral.
Art. 5° A atuação religiosa será feita sem ônus para os cofres públicos.
Art. 6° Constituem, dentre outros, serviços de capelania:
I - trabalho pastoral;
II - aconselhamento;
III - orações;
V - ministério de comunhão cristã;
V - unção dos enfermos.
Art. 7º A assistência religiosa poderá ser ministrada:
I - aos pacientes internados em hospitais da rede pública ou privada;
II - aos reclusos internados em estabelecimentos penitenciários do Distrito Federal.
Art. 8° Para aprimorar a assistência religiosa nos locais de que trata esta Lei, os órgãos públicos e privados permitirão o franco acesso de sacerdotes, pastores ou ministros religiosos credenciados por entidades religiosas competentes, na qualidade de agentes religiosos voluntários, desde que obedeçam às normas administrativas desses órgãos.
Art. 9° O acesso às dependências dos hospitais e estabelecimentos penitenciários fica condicionado à apresentação, pelo ministro de culto religioso, de credencial especifica, fornecida pelas Secretarias de Estado de Saúde ou de Segurança Pública e Defesa Social do Distrito Federal.
Art. 10. Somente poderá ser expedida credencial mediante apresentação de termo de identificação, de idoneidade e responsabilidade, subscrito pelo órgão competente ou majoritário de representação da associação religiosa a que pertença o interessado.
Parágrafo único. A associação religiosa deverá ter sido legalmente instituída, obedecidos os requisitos e limites de atuação impostos pela legislação vigente.
Art. 11. Deverá ser criado e mantido um registro de identificação das pessoas que forem credenciadas.
Art. 12. O çredenciamento, bem como os demais termos desta Lei, serão regulamentados pelo Poder Executivo no prazo de 30 (trinta) dias, contados da data de sua publicação.
Art. 13. O regulamento da presente Lei deverá ser afixado, de forma visível, nos locais de acesso do público aos estabelecimentos; preferencialmente nas portarias.
Art. 14. O descumprimento do disposto no artigo anterior importará na imposição ao responsável pelas instituições infratoras de multa no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais)/ dia.
Parágrafo único. Sem prejuízo da aplicação da multa, as entidades infratoras e os seus representantes legais estarão sujeitos às sanções legais e administrativas cabíveis.
Art. 15. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 16. Revogam-se as disposições em contrário.

A Lei acima transcrita estabelece no art. 4º que o ingresso na assistência religiosa será mediante indicação de entidade religiosa. Para tanto, o pastor, ministro religioso ou voluntário leigo, deverá ter o consentimento expresso da igreja ou da denominação a que pertence. No artigo 6º, elenca de forma exemplificativa as ações que constituem serviços de capelania, pois ao usar a expressão “dentre outros”, significa dizer que podem ser realizados serviços de natureza religiosa que não estão expressamente mencionados na lei, a exemplo do batismo.


Nos artigos seguintes, a supracitada Lei preconiza que os religiosos serão credenciados através das entidades religiosas competentes, na qualidade de agentes religiosos voluntários. Prevê ainda, que o acesso desses religiosos às dependências dos estabelecimentos penitenciários fica condicionado à apresentação de credencial fornecida pela Secretaria de Estado de Segurança Pública.

Ao tratar novamente dessa credencial no art. 10, a Lei em apreço prescreve que “somente poderá ser expedida credencial mediante apresentação de termo de identificação, de idoneidade e responsabilidade, subscrito pelo órgão competente ou majoritário de representação da associação religiosa a que pertença o interessado”. Esse órgão de representação da entidade religiosa trata-se da Igreja Sede ou da Convenção Regional a que estiver filiada a igreja, da qual o interessado em prestar a assistência religiosa é membro.

O Parágrafo único do art. 10 exige que a organização religiosa tenha sido legalmente instituída. Significa dizer que deverá possuir estatuto devidamente registrado em Cartório de Registro de Pessoas Jurídicas. Ressalva-se que no texto da Lei consta a expressão “associação religiosa”, porque foi editada antes da vigência do Código Civil, instituído pela Lei Federal nº 10.825, de 22/12/2003, que inseriu as igrejas no rol das pessoas jurídicas de direito privado com a designação de “organizações religiosas”. Por derradeiro, o art. 12 remete o credenciamento e demais disposições para a regulamentação a ser promovida pelo Poder Executivo.

A Lei em apreço foi regulamentada pelo Decreto nº 30.582, de 16 de julho de 2009. Esse Decreto reitera e detalha as principais regras contidas na Lei do Distrito Federal nº 3.216, de 05 de novembro de 2003. No art. 4º, § 6º, destaca que no acesso ao estabelecimento prisional deverão ser observadas as normas de segurança e disciplina interna, conforme as peculiaridades da instituição penal, cabendo à Secretaria de Segurança Pública regulamentar a matéria por meio de Portaria.

Essa exigência de se observar as peculiaridades do estabelecimento se deve às diferenças de rigor na segurança entre os regimes prisionais. O regime fechado é o mais rigoroso em razão da gravidade dos crimes cometidos e do tempo de duração das penas, exigindo elevado grau de segurança prisional. O semiaberto é o regime intermediário e o aberto o mais brando, sendo não raras vezes convertido em prisão domiciliar em razão da inexistência de Casa do Albergado no Distrito Federal, unidade que seria destinada ao regime aberto.

O art. 5º desse Decreto exige que a entidade religiosa interessada em prestar assistência promova o seu cadastramento e indique os seus representantes para serem credenciados. Portanto, as organizações religiosas (igrejas) são cadastradas e os religiosos (capelães) são credenciados no órgão competente. O art. 5º enumera os documentos necessários para tais providências. Para o cadastramento das entidades religiosas devem ser apresentadas fotocópias autenticadas dos seguintes documentos: a) Estatuto social devidamente registrado em Cartório de Registro de Pessoa Jurídica; b) Ata de eleição e posse de seus dirigentes, devidamente registrada em Cartório; c) Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica - CNPJ; e, d) Termo de Identificação, de idoneidade e Responsabilidade, subscrito pelo órgão competente ou majoritário de representação da Associação Religiosa.

Para o credenciamento das pessoas que vão ministrar a assistência religiosa, são exigidas fotocópias autenticadas dos documentos: a) carteira de identidade; b) comprovante de residência; c) comprovante da condição de membro de instituição religiosa há pelo menos seis meses. Devem atender ainda aos seguintes requisitos: a) ser maior de 18 anos; b) estar no exercício de seus direitos civis e políticos; c) estar em condição regular no país, se for estrangeiro; e, d) possuir idoneidade moral ilibada.

O § 2º do art. 5º ressalva que, em face da natureza do estabelecimento penal, poderá ser exigido que o religioso não seja egresso e não possua vinculo de parentesco com interno de qualquer dos estabelecimentos penais do Distrito Federal. O parágrafo seguinte acrescenta que poderão ser exigidos ainda outros requisitos, diante das peculiaridades de cada unidade, o que deverá ser feito mediante Portaria especifica.

O art. 6º do supracitado Decreto enfatiza que o religioso, ao realizar as suas atividades, deverá acatar as “determinações legais e as normas internas de cada entidade de internação coletiva, a fim de não por em risco as condições do internado, dos prestadores de serviços na internação e a segurança do ambiente”.

No art. 7º está prevista a suspensão do credenciamento pelo prazo de até 90 (noventa) dias. Isso, na hipótese de o religioso ter comportamento incompatível com as finalidades da assistência religiosa, ou ainda provocar disputa ou confronto entre as celebrações realizadas por outra entidade religiosa. Caso ocorra a reincidência, o credenciamento do pastor, ministro ou voluntário leigo poderá ser cancelado e obviamente ser impedido de continuar prestando o serviço.

Além desse Decreto de regulamentação, foi expedida inicialmente a Portaria nº 22, de 21 de março de 2011, pela Secretaria de Estado de Segurança Pública do Distrito Federal – SSP/DF, publicada no Diário Oficial do Distrito Federal (DODF) nº 56, de 23 de março, de 2011, que estabeleceu normas aplicáveis ao Sistema Penitenciário local, complementares ao referido Decreto. Auxiliei nos trabalhos de elaboração dessa Portaria durante minha gestão como Diretor Geral da Subscretaria do Sistema Penitenciário do Distrito Federal. Esse instrumento normativo, entretanto, foi revogado posteriormente pela Portaria nº 58, de 13 de agosto de 2015, publicada no DODF nº 158, de 17 de agosto de 2015, que atualizou as normas aplicáveis ao Sistema Penitenciário da Capital Federal.

No tocante às Unidades Hospitalares, as normas específicas estão previstas na Portaria nº 129, de 08 de setembro de 2004, expedida pela Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal, publicada no DODF nº 174, de 10 de setembro de 2004. 

Por outro lado, a título de referencia, importante mencionar que algumas instituições públicas criaram quadro próprio para o desempenho da capelania. Os religiosos que compõem esses quadros são denominados Capelães e prestam assistência religiosa prioritariamente para os integrantes dessas instituições. É o caso das Polícias Militares de vários Estados da Federação, bem como das Forças Armadas. Exemplo disso é a Lei nº 6.923, de 29 de junho de 1981, alterada pela Lei nº 7.672, de 23 de setembro de 1988, que organizou o Serviço de Assistência Religiosa nas Forças Armadas, com a finalidade de “prestar assistência religiosa e espiritual aos militares, aos civis das organizações militares e às suas famílias, bem como atender a encargos relacionados com as atividades de educação moral realizadas nas Forças Armadas”.

Diante do exposto, concluímos que se faz necessário verificar a legislação em vigor no âmbito de cada Estado da Federação, a fim de constatar a existência de lei, decreto e portaria que tratam especificamente da atividade de assistência religiosa. Alguns requisitos ou exigências para a prestação desse serviço podem ser diferentes de um Estado para outro, conforme as peculiaridades de cada região do país. As condições de organização, funcionamento e lotação das unidades hospitalares, bem como dos estabelecimentos prisionais, podem também influenciar diretamente nos procedimentos previstos para o acesso dos religiosos e o desenvolvimento de suas atividades. Trata-se, pois, de atividade assegurada pela Constituição Federal, todavia o exercício da assistência religiosa precisa se ajustar à realidade de cada local onde será desempenhada.

segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

A IGREJA DENTRO DA LEI - Legitimidade das Doações dos Fiéis

Por Adiel Teófilo.

Requisitos legais de validade das doações dos fiéis e os vícios que podem causar a anulação dessas doações.

É de conhecimento geral que as igrejas evangélicas costumeiramente pedem aos seus fiéis que contribuam com dízimos e ofertas, além de outras formas de doação. O principal argumento que se utilizam para justificar esses pedidos é a necessidade de manter o funcionamento das atividades regulares da igreja, custeando as despesas de manutenção, limpeza e conservação, bem como a remuneração dos seus líderes e de funcionários contratados, dentre vários outros encargos eclesiásticos.

Não obstante ser muito comum essa prática, a reflexão sobre a legitimidade dessas doações conduz inevitavelmente a alguns questionamentos, tais como: será que todas as doações efetuadas pelos fiéis são juridicamente válidas? As igrejas podem empregar quaisquer meios para pedir doações? As entidades religiosas podem se utilizar livremente dos bens e valores doados para qualquer finalidade, inclusive para fins diferentes daquele que foi apresentado quando se pediu os dízimos e as ofertas? Essas indagações serão respondidas mediante uma abordagem eminentemente jurídica, e não teológica, pois o presente estudo enfoca o cumprimento da lei por parte das igrejas evangélicas.
  
Desse modo, importante considerar que as ofertas, dízimos e demais contribuições, sejam em dinheiro, bens móveis ou imóveis, que os fiéis doam para as igrejas, caracterizam-se juridicamente como contrato de doação. Essa espécie contratual está conceituada no art.538, do Código Civil - Lei nº 10.406, de 10/01/2002, que assim preconiza: Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra.”. Ressalta-se que todos os artigos doravante mencionados são do Código Civil de 2002.

Diante disso, essa relação contratual no âmbito das igrejas precisa ser analisada sob dois ângulos diferentes: de um lado, a conduta da entidade religiosa que pede e aplica as doações, e, de outro, a condição da pessoa que faz a doação e a natureza dos seus bens e valores que serão doados. É bem verdade que sem as duas partes, doador e donatário (pessoa que recebe a doação), o processo não se completa, porém há aspectos relevantes que precisam ser considerados separadamente, visando compreender melhor a regularidade das doações destinadas às igrejas.

Iniciemos pela condição do doador. Indaga-se: toda pessoa pode doar o que bem quiser? A resposta mais comum é sim. Dizem que a pessoa pode doar tudo, desde que esteja doando aquilo que lhe pertence. No entanto, do ponto de vista legal, para que a doação tenha validade como negócio jurídico é necessário que atenda aos requisitos previstos em lei. O primeiro desses requisitos é a capacidade civil, prevista no art. 104, inciso I. Significa dizer que a pessoa do doador deve ter pelo menos 18 anos completos, quando então fica habilitada para a prática de todos os atos da vida civil, conforme art. 5º, podendo figurar normalmente como doador dos seus bens.

Surge então a seguinte pergunta: como ficam as ofertas em dinheiro entregues nas igrejas por crianças, adolescentes e jovens menores de 18 anos? A resposta requer a análise da capacidade civil do doador. Vejamos. Os menores de 16 anos são considerados absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil, de acordo com o art. 3º. Qualquer negócio jurídico por eles eventualmente celebrado é considerado nulo, de nenhuma validade, consoante art. 166, inc. I. Logo, não podem agir sozinhos como doadores. Precisam da figura do representante para atuar em nome deles.


Quanto aos maiores de 16 e menores de 18 anos, ainda não emancipados, são considerados relativamente incapazes no tocante a certos atos da vida civil ou à maneira de exercer esses atos, segundo regra do art. 4º, inc. I. O negócio por eles praticado é anulável, pode ser anulado, conforme art. 171, inc. I. Isto é, o negócio permanece válido a partir de sua celebração, contudo pode ser anulado em razão da falta da capacidade civil plena. Por isso, não podem igualmente atuar sozinhos como doadores. Devem ser assistidos por alguém que seja civilmente capaz.

A fim de proteger o interesse dos menores, o art. 1.630 estabelece que os filhos estão sujeitos ao poder familiar exercido pelos pais enquanto menores de 18 anos de idade. Por essa razão, o art. 1.534, inc. VII, confere aos pais plenos poderes, tanto para representar os filhos menores 16 anos, quanto para assistir os maiores de 16 e menores de 18 anos. Isso, em todos os atos da vida civil que se fizerem necessários, a fim de suprir o consentimento que esses menores não podem validamente expressar na celebração de qualquer contrato.

Aplicando esses conceitos ao cotidiano das igrejas, podemos constatar o seguinte. Os pais ou responsáveis, via de regra, presenciam as liturgias nas igrejas e têm não apenas o conhecimento, mas também manifestam o consentimento, ainda que de forma tácita, quanto às doações efetuadas por seus filhos menores. Não raras vezes, os próprios pais lhes fornecem esses recursos financeiros, ensinando-os na prática da liberalidade, generosidade e amor ao próximo. Assim sendo, inevitável é concluir que as pequenas ofertas e contribuições em dinheiro, apresentadas nas igrejas por crianças e adolescentes, são doações juridicamente válidas. O cuidado que se deve ter é quando a doação é notoriamente de grande valor e o menor não se faz acompanhar do seu representante ou assistente legal.

Ainda sob o ângulo do doador está a apreciação referente à natureza dos bens e valores que são doados. E aqui entra o segundo requisito para que o negócio jurídico seja realmente válido: o objeto da doação deve ser lícito, possível, determinado ou determinável, conforme art. 104, inc. II. O ato negocial que não cumprir esse requisito será consequentemente nulo, sem validade jurídica, consoante art. 166, inc. II. Assim sendo, objeto lícito é aquele que está de acordo com a lei, a moral e os bons costumes. Decorre disso que o bem ou valor a ser doado não pode ser de origem ilícita, a exemplo de dinheiro proveniente de furto, roubo ou tráfico de drogas. Obviamente que não se questiona a origem das pequenas importâncias em dinheiro ofertadas nas igrejas, entretanto não se pode aceitar ofertas vultosas sem questionar sua procedência, sob pena de estar concorrer para a prática de crime.

No que concerne ao objeto ser possível, trata-se daquele que é realizável, praticável, pois não se pode doar aquilo que é impossível de se transferir para o patrimônio de outra pessoa. Exemplo disso é doar um terreno no céu. Objeto determinado é aquele que pode ser estipulado, especificado, pelo gênero, quantidade e qualidade, como a doação de certo veículo. Determinável é o objeto incerto, descrito apenas por elementos mínimos quanto ao gênero e quantidade, para individualização no futuro, como doar parte de uma safra de cereais sem saber da qualidade do grão.

Além desses requisitos referentes ao objeto da doação, existem normas que limitam o volume total de bens ou valores a serem doados. É o caso do art. 548, que considera nula a doação de todos os bens do doador, sem que reserve para si uma parte de bens ou renda que sejam suficientes para a sua própria subsistência. Por isso não terá validade a doação integral de salário ou aposentadoria se o doador depender disso para sobreviver, podendo ser exigida a restituição dos valores. 

Outra limitação é a do art. 2.007, que estabelece a possibilidade de reduzir as doações quando constatar que o doador se excedeu quanto aos bens que realmente poderia dispor. Esse preceito tem por finalidade proteger inclusive o direito dos herdeiros necessários (descendentes, ascendentes e cônjuge), pois a eles pertence de pleno direito a metade dos bens da herança, conforme preceituam os art. 1.845 e 1.846. Nota-se, em face dessas normas legais, que o doador não pode simplesmente doar tudo o que possui, atitude que não deve ser aceita nem incentivada pelas igrejas por ser contrária à lei.

O terceiro requisito para a doação ter validade como negócio jurídico é que obedeça a forma que a lei prescreve ou a forma que a lei não proíbe para a sua realização, segundo o art. 104, inc. III. O art. 541 determina que a doação será feita por meio de escritura pública, como é o caso dos imóveis, ou instrumento particular, no caso de bens móveis. O Parágrafo único do art. 541 assegura que a doação verbal será válida, quando se tratar de bens móveis de pequeno valor e o doador entregar de imediato o bem doado para o donatário. Por essa razão são perfeitamente válidas as doações de objetos, utensílios e outros bens móveis de pequeno valor que os fieis fazem em favor das igrejas sem qualquer documento escrito.   

Vamos analisar agora a conduta da entidade religiosa que pede e aplica as doações. As igrejas possuem ampla liberdade para estabelecer a sua forma de organização, sua estruturação interna e o seu modo de funcionamento, conforme art. 44, § 1o. Com suporte nesse dispositivo, as igrejas são livres também para definir a maneira mais conveniente e oportuna de pedir as doações, seja em dinheiro, bens ou valores. Todavia, por se estabelecer na doação um contrato, os participantes dessa relação contratual (o fiel como doador e a igreja como donatária) estão obrigados a guardar, tanto no momento da celebração do contrato quanto na sua execução, os princípios de probidade e boa-fé, por força do art. 422.  Lembrando que probidade é honestidade, retidão ou integridade de caráter, e, boa-fé é sinceridade, lisura e confiança recíproca entre as partes.

Percebe-se em vista desses princípios que não basta a simples manifestação de vontade do doador, no sentido de doar um bem ou valor para a igreja, para que a doação se torne definitivamente válida. É necessário que não ocorram vícios que afetam a livre declaração de vontade nem a boa-fé do doador. Porquanto, esses vícios constituem defeitos do negócio jurídico e podem acarretar a anulação e o consequente desfazimento da doação, além de gerar para a igreja a obrigação de reparar eventuais perdas e danos.

Dentre os vícios que maculam a livre manifestação de vontade, o que mais ocorre em determinadas igrejas é a coação. De acordo com o art. 151, a coação capaz de viciar a declaração de vontade é a que chega ao ponto de incutir o fundado temor de dano iminente e considerável à sua pessoa, à sua família ou aos seus bens. Não é difícil entender essa regra jurídica quando confrontada com os rituais de certas organizações religiosas, que frequentemente se utilizam de meios de coação para angariar mais contribuições. 

Lamentavelmente, existem nos vários tribunais em nosso país diversas ações judiciais condenando essas igrejas ao pagamento de indenizações ou obrigando-as a restituir os bens e valores doados. Isso, por terem coagido seguidores a doarem seus bens em troca de bênçãos ou de proteção espiritual. Nesses locais as pessoas podem ser coagidas a doar dinheiro e bens mediante violência psicológica tão ampla e profunda, inclusive sob a pena de padecer doenças, sofrimentos e perdas materiais, que anula completamente a sensatez e o bom-senso na manifestação de vontade do doador. Resta apenas pleitear judicialmente a anulação da doação efetuada nessas circunstâncias.

Outro problema grave é a destinação dos bens que foram doados, pois nem sempre as igrejas utilizam o dinheiro exatamente nos fins para os quais pediram as doações. Os fiéis em alguns casos são enganados e iludidos pelas falsas necessidades de manutenção da igreja, quando na verdade seus líderes desviam recursos, formam patrimônio pessoal invejável, constroem obras faraônicas incompatíveis com os fins da igreja, compram emissoras de televisão, realimentando desse modo a máquina de pedir doações por meio do marketing televiso. Uma investigação apurada pode comprovar até mesmo a prática de crimes, como já ocorreu antes em nosso país. 

Diante de todo o exposto, cabe aos doadores o bom senso e o discernimento necessários para avaliar a imparcialidade dos métodos utilizados na coleta de ofertas e contribuições, bem como analisar se a igreja aplica adequadamente os recursos financeiros que são doados. Quanto às igrejas, cabe adotar alguns cuidados ao pedir as doações, além de observar os requisitos legais exigidos no contrato de doação, conforme explanados acima, visando não incorrer em práticas que podem ocasionar a invalidade das doações e consequentemente a sua anulação. Todas essas observações são importantes, para evitar os pavorosos escândalos que ecoam quando as igrejas são chamadas a responder por demandas judiciais que pleiteiam a devolução de bens ou valores que foram doados por fiéis. Enfim, a igreja precisa atuar dentro da lei.