Por Adiel Teófilo.
O Brasil vem enfrentando a pandemia do coronavirus
(Covid-19), desde o dia 20 de março de 2020, quando o Congresso Nacional
promulgou o Decreto Legislativo nº 6, reconhecendo o estado de calamidade
pública. Essa data marca o início da implantação em todo o território nacional de
diversas medidas de enfrentamento da pandemia, sendo que em alguns Estados e
Municípios foram impostas regras de isolamento social, restrição de várias
atividades e proibição de aglomeração de pessoas. Essas medidas inevitavelmente
atingiram o funcionamento das igrejas, impedindo a realização das suas atividades
e celebrações coletivas regulares.
Diante disso, as denominações evangélicas, principalmente
aquelas que não possuem programas de rádio e/ou televisão, foram forçadas a
buscar rapidamente outros meios de manter o contato com os seus membros. Nesse sentido,
as redes sociais foram de grande valia, pois viabilizam o contato virtual com a
membresia, a custo baixo, através de aplicativos e canais de comunicação pela
internet, possibilitando, embora à distância, a realização das celebrações
religiosas, como cultos, escolas bíblicas e ministração da Ceia ordenada pelo
Senhor Jesus Cristo.
O desafio da igreja
fora dos templos
Nesse tempo de pastoreio e ministrações à distância, o grande
desafio para líderes e liderados é continuar sendo Igreja mesmo fora dos
templos. A habitualidade das celebrações presenciais durante a semana foi substituída
de forma súbita e inesperada por momentos on
line, nos quais não há proximidade afetiva entre as pessoas, nem a interação
direta entre os integrantes da comunidade local. Não resta dúvida de que esse
afastamento social implica numa perda substancial da qualidade dos cultos e na
impossibilidade de se desenvolver uma comunhão cristã íntima entre o povo.
Esses problemas não ocorrem apenas em razão do isolamento
social em si mesmo como medida de contenção da pandemia. Eles são ocasionados
também por outras deficiências, como a inabilidade de certas pessoas em lidar
com as novas tecnologias da informação, as distrações comuns da rotina do lar, e
ainda, as dificuldades de muitos crentes em realizar devocional familiar, que propicie
o ambiente favorável à participação exitosa nas ministrações à distância.
Além disso, precisamos considerar uma realidade presente em
várias denominações evangélicas. Há
igrejas que não constroem a visão voltada ao aprimoramento da comunhão entre os
seus membros fora do ambiente dos templos, nem aplicam práticas capazes de tornar
a vida cristã num estilo de vida mais comunitário e menos restrito ao templo.
As igrejas com desenvoltura nessa prática são aquelas que realizam frequentes atividades
com grupos menores, funcionando no âmbito familiar, qualquer que seja a
nomenclatura atribuída ao programa. Criam dessa forma condições favoráveis para
gerar intensa comunhão, o que pode ajudar bastante a superar o distanciamento em
tempo de crise como esse que enfrentamos. Talvez seja necessário reinventar a
forma de expressar a comunhão da igreja como preparação para situações semelhantes
no futuro.
Esse ambiente de restrição social causado pelas medidas
decorrentes da pandemia, que vem se estendendo ao longo de semanas em vários Estados
da Federação, deve ser ainda objeto de cuidadosa reflexão acerca dos impactos que
pode causar nas igrejas evangélicas em todo o país. E aqui é pertinente fazer
um importante registro: a Igreja como Corpo
de Cristo na Terra não se abala nem se detém diante de pandemias, calamidades
ou perseguições, mas permanece firme sobre a Rocha, a Pedra de Esquina, na qual
está edificada, prevalecendo contra as portas do inferno.
A Igreja, no entanto, como Corpo Local, constituída por pessoas
que se reúnem sob as diversas denominações evangélicas, pode sofrer alguns
impactos consideráveis, provocados por essa mudança repentina de comportamento
social, que foi imposta a toda sociedade como forma de minimizar os efeitos da
pandemia.
O impacto espiritual
O
primeiro reflexo que algumas igrejas podem experimentar é o impacto espiritual. Isso diz respeito diretamente aos seus membros, pois
cada pessoa reage de forma diferente em face das mesmas circunstâncias. É
semelhante à reação de alguns alimentos que passam pela água fervente: a
cenoura amolece, o ovo endurece no seu interior, e, o pó de café se mistura à
água dando-lhe cor e sabor.
Desse
modo é possível que o isolamento social provoque em determinados cristãos maior
fervor espiritual. Podem crescer no temor a Deus, aproximando-se do Senhor
Jesus por meio de orações, súplicas, leitura e meditação da Escritura, ainda
que premidos por certas dificuldades inerentes à pandemia. O calor da provação
produz neles o quebrantamento espiritual e a dependência do Senhor Jesus. Certamente
precisarão ser trabalhados, visando manter o fervor espiritual mesmo depois que
cessar a calamidade.
Outros
cristãos, infelizmente, poderão declinar para o esfriamento espiritual,
diminuindo o zelo, a comunhão e até mesmo a fé no Senhor Jesus. Pode ocorrer
que se afastem gradativamente do Evangelho, como consequência do distanciamento
da vida cristã comunitária, ou ainda, que se tornem pessoas de coração
endurecido, resistente e questionador, quanto ao propósito de Deus em meio a
essa pandemia que tem ceifado milhares de vidas em todo o mundo. Nesses, o
calor da provação gera indiferença, incredulidade e isolamento do Corpo de
Cristo. Será necessário esforço para resgatar e restaurar esses crentes à
comunhão dos santos.
Temos
ainda, para a alegria do Senhor e satisfação da liderança, o grupo dos crentes
fiéis. É formado por aqueles cristãos maduros e experimentados na fé, que não
se abalam no tempo da adversidade, nem se desanimam no momento da calamidade,
mas permanecem firmes e confiantes na direção e provisão que vem de Deus.
Aprenderam a ter fartura e também a passar por escassez, sabem desfrutar da
alegria dos ajuntamentos solenes e também enfrentar a solidão do isolamento
social, pois em toda e qualquer situação o Senhor é Quem lhes fortalece. Para
esses, a adversidade é momento oportuno para crescer na fé e compartilhar o
amor e a salvação em Cristo a todos quantos puderem falar. Resta-nos ser gratos
a Deus por esses crentes que dão o verdadeiro sabor de Cristo a essa geração.
Essas
são, de modo geral, algumas das consequências espirituais que podem afetar os
cristãos nesse tempo de pandemia. O que realmente vai acontecer com cada Igreja
Local, somente será possível avaliar no pós-pandemia, quando for restabelecida
a normalidade dos cultos e demais celebrações coletivas presenciais. Cabe a
cada líder ter a sensibilidade e o discernimento necessários para compreender o
que se passa no coração dos seus liderados, buscando assim suprir as carências
espirituais de cada um.
O impacto emocional
Outra
consequência inegável da pandemia é o impacto
emocional. Não há registro na história recente de tempo como esse em que
todas as pessoas ficaram confinadas em suas próprias casas, por longo período,
para evitar a contaminação por uma grave doença. Esse recorte temporal deixará
marcas emocionais profundas na vida de inúmeras pessoas, que foram tomadas por
medo, ansiedade e insegurança, provocadas por uma série de fatores, que vão desde
a pouca confiança no cuidado e proteção do Senhor, passando pela falta de
orientação adequada para enfrentar esse período, até a nefasta influência de
alguns setores da mídia, que diuturnamente divulgam as piores notícias
possíveis sobre a pandemia, cumprindo uma agenda política.
A
mensuração desse impacto emocional só será possível fazê-la também no
pós-pandemia. A partir do momento em que for autorizado o retorno às atividades
regulares da Igreja, a ausência de algumas pessoas poderá ser motivada por
consequências emocionais provocadas pela pandemia. Não se pode menosprezar o
fato de que poderão estar alimentando grande receio de fazer parte dos ajuntamentos,
ainda que obedecidas rigorosamente as recomendações das autoridades públicas de
saúde no interior dos templos. Será necessário tempo e acompanhamento para que
restabeleçam a confiança e retornem à normalidade do convívio social em todos
os seus aspectos.
Por
outro lado, o conforto, a comodidade e a segurança de participar em casa das
celebrações virtuais da igreja poderão concorrer para alimentar certo distanciamento
do templo. É bem verdade que muitos preferem a proximidade e o contato pessoal,
mas também há pessoas que se comportam de forma diferente, que consideram como suficiente
os contatos virtuais e a comunicação à distância, as quais podem facilmente transferir
esses conceitos para as ministrações dos cultos pela internet. Lidar com essa
situação requer habilidade para comunicar os ensinos da Escritura que ressaltam
a importância da comunhão pessoal entre os membros do Corpo de Cristo.
O impacto financeiro
Outra
situação que pode atingir as organizações religiosas é o impacto financeiro. É notório que no combate à pandemia, o comércio
em geral foi fechado e foram totalmente suspensas inúmeras atividades públicas
e privadas. Isso tem provocado a falência de milhares de empresas e a demissão
em massa de milhões de trabalhadores, aumentando drasticamente o número de desempregados
que perderam a sua fonte de renda. O reflexo dessa lamentável conjuntura
econômica sobre as igrejas é inevitável, pois muitos crentes não poderão
continuar contribuindo com dízimos e ofertas nos mesmos valores que faziam
antes dessa crise.
Essa
perda de arrecadação poderá afetar duramente o custeio e a manutenção das
igrejas. Aquelas em que for elevado o número de membros desempregados, com a
consequente redução das contribuições, poderão enfrentar várias dificuldades
para honrar os seus compromissos, como prebenda pastoral, salário de
funcionários, tarifas de energia elétrica, água, telefone, dentre outras. Até
mesmo a existência de algumas igrejas poderá ficar comprometida, na medida em
que não conseguirem levantar os recursos suficientes para pagar o aluguel do
templo.
Tudo
isso demonstra que será necessário reorganizar as despesas, reduzir custos e
estabelecer prioridades, visando manter a continuidade e o funcionamento da
instituição dentro da nova realidade financeira que se avizinha. É preciso
pensar que diante dessa crise econômica anunciada, cuja gravidade e repercussão
não são totalmente conhecidas, poderá ser necessário prestar assistência material
a número elevado de membros e congregados, demandando volume maior de recursos
financeiros para a área social.
Por
outro lado, poderá ser necessário também reformular a programação especial das igrejas,
como forma de enfrentar o período de crise econômica e manter a realização de
vários eventos. As atividades dispendiosas e que oneram financeiramente os
membros, como viagens em grupo, encontros em hotéis e jantares em restaurantes,
poderão ser substituídas por programas que sejam simples, porém agregam mais
pessoas e tenham menor custo. A criatividade e a capacidade de adaptação serão
imprescindíveis para superar os desafios financeiros gerados pela pandemia.
A esperança no Senhor Jesus Cristo
Enfim,
a pandemia do coronavírus deixará sua profunda cicatriz na história da
humanidade, criando um novo tempo em que nada na sociedade poderá ser como
antes. As consequências sociais e econômicas geradas pelas medidas restritivas
de combate à pandemia certamente lançarão seus reflexos sobre a existência e o
funcionamento de diversas igrejas em nosso país. Resta-nos diante dessa
calamidade, rogarmos ao Senhor da Igreja para que ajude os membros do Corpo de
Cristo a enfrentar as dificuldades com paciência, fé e esperança, na certeza de
que o Senhor Jesus Cristo sempre tem o melhor para os seus escolhidos.