Por André R. Fonseca.
É muito comum encontrar pregadores e
blogueiros criticando as panelinhas na igreja. Tipicamente, a crítica se
dirige aos adolescentes e jovens quando se agrupam por afinidades. Alguns
jovens, que não conseguem lugar no grupo ou grupos, sentem-se excluídos, e a
igreja deve ser sempre um lugar de inclusão onde todos se sentem acolhidos e
bem! A reclamação contra as tais panelinhas é, portanto, legítima!
Se você, leitor, veio aqui encontrar
mais um para ojerizar as panelinhas na igreja, a qualquer custo, sairá
decepcionado... Não tenho nada contra elas; mas, antes de apresentar minha
defesa, gostaria de fazer uma ressalva: de qual panelinha estamos
falando?
Além de diminutivo para panela, a
palavra "panelinha" recebe uma acepção de sentido figurado no
dicionário, "um conjunto de pessoas que se reúnem para prejudicar
outras" - segundo o Dicionário Eletrônico da Língua Portuguesa da Porto
Editora. Sou veemente contra esse tipo de panelinha! Os jovens da igreja
não podem se reunir com o intuito de prejudicar o próximo. Mas, se tratarmos o
termo "panelinha" nesse sentido mais comum do evangeliquês, não vejo
problema algum em adolescentes e jovens se reunirem por afinidades.
Eu tenho uma calopsita, domesticada
desde bebê. Foi trazida para nossa casa ainda sem penas. Foi alimentada por mim
com papinha numa seringa. Por ser um pássaro de bando, parece-me que fomos
tomados por ela como seu bando. Quando começamos a comer em sua presença, ela
vai para seu potinho de comida comer também. Por várias vezes, durante a
limpeza da gaiola, esquecemos a portinha aberta e, ao invés de fugir, ela sempre
voou ao nosso encontro. Algumas vezes, voando do quintal para o interior da
casa atrás da gente. Já percebemos que há uma gradação de preferência; se não
há ninguém em casa, ela fica com minha filha numa boa; mas, se estou em casa,
ela voa do ombro da minha filha para o meu ombro e bica forte se minha filha
tentar tirar ela do meu ombro. Mas ela morre de amores mesmo é por minha
esposa... É só ouvir a voz da minha esposa no portão de casa pra começar a
cantar desesperadamente! E não há quem fique com ela na mão se minha esposa
estiver em casa. Se há aparente seleção por afinidade para um animalzinho como
uma calopsita, por que não haveria panelinhas na igreja?
Assim como a calopsita, animal que
vive em bandos, social em seu comportamento com os outros de sua espécie, o ser
humano é um animal social também. Gostamos de viver em grupo, gostamos de ter
alguém para conversar, desejamos o convívio. Um dos treinamentos mais difíceis
para astronautas de longas viagens são os testes de isolamento. Por que a solitária
é punição tão cruel para um preso? Por que o náufrago solitário, interpretado
pelo ator Tom Hanks, escolhe conversar com o Wilson, uma bola de basquete? Se
nós somos assim tão desesperadamente dependentes do convívio com outras
pessoas, pois o isolamento enlouquece, por que não aceitar que haveremos de dar
preferência para algumas pessoas e outras nem tanto por simples afinidade? A
afinidade, coincidência de gostos ou de ideias entre os indivíduos com quem
convivemos, é tão natural quanto a nossa necessidade de convivência.
Pense um pouco... Numa família com
muitos irmãos, há sempre dois deles que andam juntos para todos os lados,
compartilham segredos que os outros nem suspeitam ou que tendem a ser mais
cúmplices um do outro em suas "aventuras". Se assim acontece
naturalmente entre irmãos de sangue, por que não haveria panelinhas
entre irmãos da igreja?
A tal panelinha, criada por
afinidades, está presente também na escola, no trabalho, no bairro ou
condomínio, entre vizinhos, no clube de xadrez... Aqui no Brasil, no Canadá,
Rússia e Japão. E, pelo jeito, na palestina do primeiro século também! Ou vamos
ao púlpito acusar Jesus e seus discípulos de formação de panelinha?
Seria “Pedro, Tiago e João num barquinho” ou numa panelinha?
De uma montoeira de discípulos, Jesus
escolheu apenas doze. Mas esses formavam uma panelinha tipo classe “platinum”.
Entre os doze, esses três do barquinho da Galileia formavam a panelinha
“Golden”. Na transfiguração, um dos marcos no ministério de Jesus, quais foram as
testemunhas sortudas? Pedro, Tiago e João. Momento ápice do ministério, a
oração no Getsêmani, Jesus vai com os discípulos para o lugar, mas puxa para
mais próximo a sua panelinha: Pedro e os dois filhos de Zebedeu! Mas, ainda
assim, podemos dizer que havia o discípulo “Golden Master Plus”, o discípulo a
quem Jesus amava... Se podemos enxergar uma relação de afinidades entre os
discípulos e Jesus, como não aceitar que na igreja as pessoas também não se
agrupem por afinidades NA-TU-RAL-MEN-TE???
Vejo que a panelinha pode ser
um problema realmente, mas acho que as pessoas estão exagerando na dose da
crítica e andam também classificando qualquer relação de afinidade como “panelinha
deplorável”!
O discurso é típico: “Irmãos, em
nosso churrasco de confraternização, observamos que o objetivo não foi
alcançado! Os irmãos se agruparam nas panelinhas de sempre!”
Esperar que os irmãos não se
confraternizassem no evento, no churrasco ou no bate-papo na saída do culto, em
grupos formados por afinidades é querer sonhar com uma igreja formada por
pessoas que não existem! É querer projetar na igreja um ideal impossível de ser
alcançado. Minha proposta seria apenas aceitar que isso é natural, aceitável e
desejável. Uma igreja saudável não é aquela que não tem panelinha, mas
aquela que entende que é natural para as pessoas se agruparem por afinidades e
que cada indivíduo precisa se enquadrar em sua própria turma. Não criticar o
grupo que gosta de conversar sobre teologia quando você acha que teologia é um
porre desnecessário! Se você não gosta de teologia, meu filho, não espere por
mim. O papo é futebol? Tenho dois motivos pra não fazer parte do seu grupo. São
afinidades... Não vou criticar aqueles que curtem conversar sobre futebol.
Entendeu? São eles lá, e eu aqui com os meus, e todos são felizes!
Não sei se foi exatamente isso o que
meu amigo blogueiro Denis quis dizer com “panelinha sem tampa”; mas
concordo com ele, se minha interpretação de sua metáfora estiver correta, que a
panelinha fechada é realmente um problema comum. Uma panelinha
sem tampa, sem bloqueio, sem impedimento para novos integrantes que
compartilham das mesmas afinidades é o recomendável.
Vamos tomar o devido cuidado para não
generalizar. Vamos tentar identificar as panelinhas fechadas e as
destampadas antes de sair criticando. Vamos louvar as confraternizações
saudáveis definidas por afinidades. Combinado?
Autor: André R. Fonseca.
Fonte: Blog Bereianos.
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